A expressão popular que
assevera nada ser por acaso é trazida à literalidade no caso dos primeiros
núcleos de povoamento de Fátima. Este município do agreste baiano, situado há
algumas poucas centenas de quilômetros do litoral, tanto da Bahia como de
Sergipe, guarda em seus costumes contemporâneos a semente de um passado
demasiadamente distante no tempo cronológico.
Os vaqueiros, hoje,
figuras indissociáveis do cotidiano do fatimense, quem diria, estão na gênese
do povoamento desta terra e da formação do seu povo e cultura, atualmente
expressada na forma de vaquejadas, cavalgadas e em um verdadeiro culto ao
animal base desta cultura, o boi.
Não é por acaso que a
força de ligação com a criação de gado e as subatividades econômicas inerentes
à esta, são tão fortes na vida dos habitantes desta terra, pois foi graças aos
vaqueiros do passado, aos quais não guardo homenagem ou crítica, que essas
terras foram povoadas ou, dependendo do ponto de vista, tomada dos povos
indígenas que já habitavam essa região há séculos ou milênios.
Essas comunidades eram
provavelmente da etnia kiriri, hoje “reduzida” à biocenose quilombola no atual
município de Banzaê. Vestígios de cemitérios indígenas, como urnas funerárias e
ossadas foram encontrados em Paripiranga e na cidade de Cícero Dantas, quando
da construção do estádio municipal daquela cidade. Aqui em Fátima, achados
arqueológicos guardados por populares como um artefato emblemático encontrado
na localidade fatimense da Lagoa da Volta, nos ajuda a contar essa história. Um
deles é uma belíssima ponta de lança entalhada em pedra lascada que ainda
necessita de estudos posteriores, nos ajudando, dessa forma, a deduzir que os
colonos foram expulsando os kiriris de leste para oeste, isto é, partindo do litoral,
chegando aos atuais territórios de Paripinga, Fátima, Cícero Dantas e
finalmente a posição atual em Banzaê.
Mas voltando a falar
dos vaqueiros, sua chegada a essa região é documentada, de acordo com Isabel
Camilo de Camargo (2014), em princípios dos século XVIII. Com a saturação das
terras litorâneas, amplamente utilizadas para a lavoura canavieira, era preciso
avançar em direção ao interior na busca de terras para a pecuária e alimentar a
crescente população.
Os cursos dos rios
foram os caminhos mais “fáceis”, sendo as principais rotas o São Francisco, que
à época chegou a ser conhecido como “o rio dos currais”, o Itapicuru e o
Vaza-barris, este último, provável rota utilizada pelos primeiros brancos a
chegarem a esta região. Viajando a pé, os desbravadores conduziam suas boiadas
enfrentando as dificuldades impostas pela natureza como a vegetação, terrenos
de difícil acesso e similares para se estabelecer em locais propícios ao seu
ofício, expulsando os indígenas que pouco poder de resistência tinham contra os
invasores.
Essas “conquistas”,
aliás eram motivos de prendas concedidas a estes homens pela coroa portuguesa,
que cedeu as áreas antes dominada por indígenas aos próprios criadores de gado
com a intenção de estabelecer o domínio da terra pela coroa portuguesa e de
fazer com que esta produza e gere lucros.
E foi assim que o
interior baiano e as terras que hoje compõem o atual município de Fátima foram
colonizadas. Nascidas da violência contra os povos autóctones e da desejo de
consecução do homem branco, Fátima hoje guarda nas tradições do seu povo as
suas origens ocultas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário