O foco desse blog é a pesquisa da história do Sertão baiano.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2023

Quem foi João Lucino?

 

Imagem ilustrativa

A história que vou contar hoje apareceu para mim como um desses mistérios intrigantes do passado. Como eu cresci na Praça Ângelo Lagoa, tive um contato significativo com esse nome de uma das ruas que cruzam a praça. Logo notei que, diferentemente da Ângelo Lagoa, da qual os mais velhos sempre faziam questão de dizer que homenageava o fundador da cidade, a origem do nome da Rua João Lucino era quase que desconhecido por todos.

Mais tarde, já como pesquisador da história local, percebi que alguma pessoas até conheciam a história, mas não gostavam de falar e isso, naturalmente, me intrigou ainda mais.

Recentemente, junto com o pesquisador Juan Kléber, fiz um breve levantamento da história e, contando com a valiosa colaboração deste, do ex-prefeito Eduardo Pires e de Seu Zé Borges, pudemos traçar uma versão, baseada em diversos depoimentos e indícios do que teria levado à nomeação da via que liga a praça da Matriz à Rua da Lage com esse nome.

Antes de qualquer coisa, quero afirmar que é esse um assunto complexo, mesmo tendo o fato ocorrido por volta dos anos 1930 estamos falando de um assassinato e famílias conhecidas da cidade (a minha, por exemplo) têm os seus nomes envolvidos na trama. A despeito dos longos anos e de todos os implicados na morte e no defloramento em questão já terem morrido, tomarei o cuidado de não citar nenhuma linhagem familiar do caso para evitar constrangimentos e descontentamentos. Afinal, o objetivo aqui nunca foi esse, sempre buscamos preservar os fatos que compõem a nossa história.

Feitas as devidas ressalvas, buscarei relatar o ocorrido iniciando pela identificação de João Lucino e em seguida me atentarei às circunstâncias que levaram ao crime.

Seu nome completo é desconhecido, mas sabe-se que morava na região da Ilha e carregava fama de valente e encrenqueiro. Uma de suas irmãs que morava no Monte Negro, costumava ter rusgas com vizinhos, inclusive com Ludgero Félix, pai de João Maria, também tinha uma personalidade forte e, conta-se, costumava andar armada.

Consta que João Lucino também andava sempre armado, viajava com frequência da ilha para Coité (Paripiranga) passando pelo Mocó, montado num Burro. Em uma dessas passagens por aqui, se meteu em uma tremenda confusão. Teria seduzido uma moça de família tradicional e, em consequência desse episódio, teria dado uma surra em um habitante local que o teria delatado.

O fato de ter deflorado uma moça de família, já era por si só uma questão de morte para a época, mas o atrevimento da surra parece ter sido demais para a honra dos familiares da moça que, junto a outro populares, resolveu se vingar do valentão.

De acordo com relatos, em uma dessas viagens, João Lucino vinha de Paripiranga com sua mulher e ao chegar próximo ao Mocó sentiu-se muito cansado, fala-se num sono incontrolável que o teria acometido nas proximidades do que hoje é a localidade dos Cantos.

Pedindo a sua esposa para parar e descansar, ela teria insistido para que andassem um pouco mais até chegar ao Mocó, pois aquela região era perigosa para os viajantes na época.

Com dificuldades, seguiram viagem até uma quixabeira que se localizava nas proximidades de onde hoje é a igreja evangélica Assembleia de Deus. Ali, embaixo da frondosa árvore deitou-se para o descanso.

Logo foram cercados por um grupo de homens, eram os irmãos da moça e outros populares que vinham atras da vingança outrora arquitetada.

Consta que João Lucino foi assassinado ali mesmo, provavelmente na presença da sua mulher que o acompanhava, levando com sangue a honra ferida da família da moça e do rapaz surrado pelo fariseu.

Os agressores acabaram presos, consta que, sob a influência do Coronel Chiquinho Vieira e dos Britos de Pombal, muitos deles foram presos e passaram alguns meses na cadeia em Cícero Dantas

Quando prefeito, em 1987, João Maria, que conhecera a irmã de João Lucino e acompanhou ainda muito jovem a história, resolveu homenagear o infeliz, batizando com seu nome a rua que se formou no local do assassinato. Recentemente a rua em questão foi rebatizada e hoje se chama Rua Liberino Vicente.

Esse é um episódio que não deve ser analisado pelos padrões de comportamento de hoje. Naquela época, “desonrar” uma moça ou espancar um homem eram ofensas que, com frequência, eram lavadas com sangue. Devemos lembrar que aqueles homens eram personagens do seu próprio tempo e dos seus costumes. Não convém, portanto, que se faça julgamentos. A história, definitivamente, não serve e este propósito.

 

Moisés Santos Reis Amaral, Professor há 20 anos do Município de Fátima, Licenciado em História pela Uniages com especialização em História e Cultura Afro-brasileira, Mestre em Ensino de História pela Universidade Federal de Sergipe. Autor das obras: Manual Didático do Professor de História, O Nazista e da HQ Histórias do Cangaço e do livro Fátima: Traços da sua História.

 

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