O foco desse blog é a pesquisa da história do Sertão baiano.

sexta-feira, 26 de novembro de 2021

Povoado Caxias contra o cangaço.

 


O relato que você terá acesso agora, faz parte dos estudos do livro Tombo da Paróquia do N. S do Bom Conselho, é mais um registro feito pelo Padre Renato Galvão em seus costumeiros estudos históricos sobre a paróquia que liderava. É uma explanação que compõem uma série documentada pelo vigário que visava levantar e preservar os dados históricos de todas as capelas da paróquia.

            A história se passa no povoado Caxias, à época, Duque de Caxias, no ano de 1938. De acordo com o levantamento do religioso, naquele ano, cansados das invasões e saques de cangaceiros, os moradores de Caxias (Os paisanas, no linguajar dos cangaceiros) se armaram para defender o vilarejo de um bando que agia nas redondezas.

Não é novidade na historiografia do cangaço esse tipo de ação da população civil. Aliar-se ao contingente de policiais disponível para defender uma vila foi prática significativa naqueles anos de cangaceirismo. Basta lembramos, por exemplo, do ataque à Mossoró- RN, onde a população se uniu à polícia militar em armas para defender a cidade e expulsar os cangaceiros. Esse evento, inclusive, marca a entrada de Lampião e seu bando na Bahia, em 1928.

A narrativa do embate em Caxias foi colhida pelo Padre Renato através da oralidade. Em 1954, apenas 12 anos após o ocorrido, o religioso entrevistou os participantes da peleja, colheu depoimentos e fez o registro no livro.

De acordo com o levantamento, em 1938, um grupo de homens liderado por um certo Boaventura Dias Lima, conhecido como Sr. Boa, aliou-se ao pequeno contingente de soldados destacados em Caxias para defender o lugarejo. Fizeram trincheira na Lagoa dos Sítios Novos e aparentemente entraram em combate com os bandidos.

Em 2018, eu entrevistei Sr. Faustino, na época com 105 anos, ele era natural de Caxias, mas vivia em Fátima há muitos anos. Na oportunidade, sem precisar o ano, Sr. Faustino me fez relatos de diversos episódios envolvendo bandos de cangaceiros em toda essa região.

Não há maiores detalhes na narração do Padre sobre esse episódio, nem é possível precisar qual foi o bando combatido em Caxias em 1938. Sabe-se, contudo, que esse foi o ano da Morte de Lampião na Grota do Angico em Poço Redondo – SE. Como não há uma data exata para o ocorrido em Caxias, fica difícil descartar ou afirmar que teria sido Lampião e o grupo principal, entretanto, é sabido que outros grupos agiam por essa região, sobretudo o grupo de Ângelo Roque.

Essa história só ilustra a intensa atividade de cangaceiros por toda essa nossa região. Após a morte de Lampião em 1938, o cangaço entra em declínio, Ângelo Roque se entregaria em Paripiranga 2 anos depois (1940) e Corisco seria morto em 1942, dando linhas finais ao capítulo “cangaço” na história do país.


Moisés Santos Reis Amaral, Professor há 19 anos do Município de Fátima, Licenciado em História pela Uniages com especialização em História e Cultura Afro-brasileira, Mestre em Ensino de História pela Universidade Federal de Sergipe. Autor das obras: Manual Didático do Professor de História, O Nazista e da HQ Histórias do Cangaço.

 


quarta-feira, 24 de novembro de 2021

Defloramento em Cícero Dantas – 1861 a 1921.


 


Você sabe o que significa DEFLORAMENTO? Esse termo foi criado pela justiça brasileira no código penal de 1830. Deflorar significa, literalmente, “tirar a flor”. Em outras palavras, tirar a virgindade de uma jovem entre 14 e 18 anos já foi considerado crime pela justiça brasileira.

Antes de mais nada, não estamos tratando aqui de estupro, que uma outra modalidade de crime devidamente registrado no código penal e que tem outras características distintas do defloramento. Este, por via de regra, ocorria consensualmente, entre jovens de idade similares, amantes mais afoitos para os padrões da época.

No código penal de 1890, o defloramento foi tipificado pelo artigo 267, como crime contra a honra e honestidade das famílias e ultraje ao poder público. Na letra da lei, lia-se: “Deflorar mulher de menor idade, empregando sedução, engano ou fraude”.

Em 1942 o defloramento foi substituído pelo crime de sedução e em 2016 o entendimento muda novamente, sendo o sexo, consensual ou não, com mulheres menores de 16 anos considerado estupro.

Analisando os processos crimes da comarca de Cícero Dantas, entre os anos de 1861 e 1921, houveram, ao menos, 15 registros de crimes de defloramento, muitos deles podem ter acontecidos com os meus ou seus antepassados. O termo popular para esse tipo de delito por aqui era outro, bem distinto e original. Dizia-se que fulano “buliu” com a filha de beltrano, ou ainda que tal rapaz “desgraçou” uma moça. Se você tem mais de 20 anos, certamente já ouviu essa expressão.

Mas voltando aos defloramentos registrados em Cícero Dantas, os casos aconteciam com certa frequência. Em média, uma vez a cada ano, um rapaz respondia perante à justiça por ter “bulido” com uma moça, as vezes um galanteador respondia por mais de um defloramento.

O ano de 1896, parece ter sido uma exceção para essa média estipulada. Naquele ano, quatro defloramentos foram registrados pelo poder judiciário da comarca. Se você levar em consideração que era esse um território muito pouco habitado, é possível presumir que o desejo dos jovens do final do XIX estava aflorado.

1896 é o ano do início da Guerra de Canudos. Vale lembrar que aquele conflito afetou de forma indireta ou direta toda essa região. Teria esse fato contribuído com o aumento substancial no número de defloramentos por aqui? Difícil dizer.

 

Casos de Defloramento registrado na comarca de Cícero Dantas – 1861 a 1921.

 

Ano

N° de casos

1861

1

1880

1

1886

1

1896

4

1901

1

1905

1

1906

1

1914

1

1915

2

1916

1

1921

1

 

 

Moisés Santos Reis Amaral, Professor há 19 anos do Município de Fátima, Licenciado em História pela Uniages com especialização em História e Cultura Afro-brasileira, Mestre em Ensino de História pela Universidade Federal de Sergipe. Autor das obras: Manual Didático do Professor de História, O Nazista e da HQ Histórias do Cangaço.


segunda-feira, 22 de novembro de 2021

O Povoado Ilha é mais velho que Fátima.


 

Recentemente eu iniciei os estudos dos registros da Igreja de Cícero Dantas, foi a mim disponibilizado 300 páginas de manuscritos em um português arcaico, muito difícil de interpretar. As dificuldades de leitura, contudo, são atenuadas pelas inúmeras e incríveis descobertas que brotam de tais registros.

Os livros Tombo, são os diários dos sacerdotes, neles são registradas todas as atividades paroquiais. Os temas são bastante diversos, de registros de falecimentos a construção e reforma de igrejas e capelas.

Em 1953, o Padre Renato Galvão resolve fazer um levantamento histórico das capelas da sua paróquia, entrevistando moradores e pesquisando em documentos antigos, reuniu informações sobre os templos religiosos. Sobre o povoado Ilha, escreve:

 

Em 1892 o povoado da ilha assistiu à sua primeira missa, em novembro. O celebrante foi o Monsenhor Vicente Martins [...] haviam apenas 5 casas.

 

Não sei o que mais surpreende, se o tempo de povoamento da Ilha ou o fato de a localidade não ter crescido ao longo desses anos e nem ter pleiteado a emancipação. Sabe-se que o povoamento da cidade de Cícero Dantas é datado do início do século XIX (a igreja da cidade foi erguida em 1812 pelo Frei Apolônio de Todi) e que, pela proximidade com a cede do município, é natural que aquela área tenha sido ocupada primeiro que Fátima.

Nessa época, o que hoje é Fátima era apenas um território ocupado por pequenas fazendas como a Maria Preta, a Lage da Boa vista e a fazenda Boa Vista. A ocupação da atual zona urbana do município só foi iniciada por volta dos anos 1920 com a chegada de Ângelo lagoa e a construção das primeiras casas ao pé da serra do mocó, onde hoje é a Praça Ângelo Lagoa.

Um registro de 1916, feito com o objetivo de descrever as características naturais e populacionais do município de Cícero Dantas já citava a Serra do Mocó como um dos acidentes geográficos da região. A Serra do Mocó é a região alta da cidade, onde atualmente estão instaladas as torres de telefonia do município.


Moisés Santos Reis Amaral, Professor há 19 anos do Município de Fátima, Licenciado em História pela Uniages com especialização em História e Cultura Afro-brasileira, Mestre em Ensino de História pela Universidade Federal de Sergipe. Autor das obras: Manual Didático do Professor de História, O Nazista e da HQ Histórias do Cangaço.


quinta-feira, 18 de novembro de 2021

Açude da Queimada Grande

 

Imagem JD Filmagens.

Há 71 anos, no dia 23 de janeiro de 1950, o Padre Renato Galvão benzia o açude da Queimada Grande.  Mesmo nos dias de hoje, a aguada representa importante reservatório de água para o município, mas sete décadas atras deve ter sido uma grande conquista para a comunidade local e para todo o município.

            A atual comunidade de Queimada Grande é originária de uma das fazendas do Barão de Jeremoabo. O Barão possuía ao menos outras duas fazendas com a denominação de Queimadas, entre elas, as terras que hoje compões o município vizinho de Adustina. Queimada Grande aparece entre os registros de terras de Bom Conselho em 1857 em nome de Maria de Santa Ana.

            O açude foi ali construído pelo DNOCS por iniciativa do Padre Renato que fez uso da sua amizade e influência junto ao Deputado João da Costa Pinto Dantas Júnior, Dr. Dantas, como o fatimense o conheceu. Ao longo da sua passagem por Cícero Dantas, o vigário fez diversos pedidos de construção de barragens que gerassem segurança hídrica para toda a região.

            No livro de Tombo da Igreja, página 24, o religioso anotou:

 

O vigário celebrou em Queimada Grande, onde benzeu o grande açude.

 

            O reservatório que outrora servia para matar a sede de seres humanos e animais de criação, hoje tem como principal função a irrigação de hortaliças em suas margens.

 

Moisés Santos Reis Amaral, Professor há 19 anos do Município de Fátima, Licenciado em História pela Uniages com especialização em História e Cultura Afro-brasileira, Mestre em Ensino de História pela Universidade Federal de Sergipe. Autor das obras: Manual Didático do Professor de História, O Nazista e da HQ Histórias do Cangaço. 


sexta-feira, 5 de novembro de 2021

Veredito (quase) definitivo da construção da Igreja de Fátima.

 




No último dia 27 de outubro, publiquei aqui no Blog História de Fátima os últimos levantamento da pesquisa que visa desvendar em quais circunstâncias se deu a construção da primeira capela onde hoje se situa a igreja matriz de Fátima.

É sabido, partindo dos relatos do Monsenhor José Magalhães e Sousa, que a capela existe, pelo menos, desde 1933, ano em que o religioso, titular da paróquia de Jeremoabo registrou ter celebrado missa, quando Fátima ainda se chamava Montalegre.

Sabendo que o Monsenhor José Magalhães substituiu o padre Vicente Martins após o falecimento desse último, estou confortável em afirmar estar quase certo que a capela primordial foi erguida durante o paroquiar do Padre Vicente Martins. Explico:

Como já relatado aqui no Blog anteriormente, o padre Vicente assume a paróquia de Nossa Senhora do Bom Conselho ainda no final do século XIX, mais precisamente em 14 de junho de 1883. Por essa época, apenas algumas fazendas (como a fazenda Maria Preta) existiam por aqui, sendo o povoamento inicial da atual praça Ângelo Lagoa datado de princípios dos anos 1920. Dito isso, é possível estabelecer, de acordo com esse raciocínio, que a capela foi erguida nesse espaço de tempo (entre 1920 e 1935).

Infelizmente, a documentação que comprovaria essa tese, não se encontra na igreja de Cícero Dantas. Essa, se existir, está armazenada nos arquivos da paróquia de Senhor do Bomfim-BA, antiga diocese que respondia por essa região.

A existência dessa documentação é incerta, os Livros Tombo do paroquiar do Padre Vicente Martins (1883-1933) não são conhecidos. Em outras palavras, não há evidências de que o padre tenha realizado as devidas anotações do seu trabalho como pároco em Cícero Dantas e se o fez, o livro pode ter se perdido.

Isto posto, é preciso lembrar de algo demasiadamente importante na história da Igreja Matriz de São Francisco De Assis. Com o estabelecimento dessas datas aqui discutidas, é possível deduzir que a igreja de Fátima está prestes a completar 100 anos, uma data que, convenhamos, deveria ser celebrada pelos fiéis.

Moisés Santos Reis Amaral, Professor há 19 anos do Município de Fátima, Licenciado em História pela Uniages com especialização em História e Cultura Afro-brasileira, Mestre em Ensino de História pela Universidade Federal de Sergipe. Autor das obras: Manual Didático do Professor de História, O Nazista e da HQ Histórias do Cangaço.

 

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