O foco desse blog é a pesquisa da história do Sertão baiano.

sábado, 29 de fevereiro de 2020

Revista em quadrinho HISTÓRIAS DO CANGAÇO.


A revista em quadrinhos que conta as histórias do cangaço na região de Fátima, Cícero Dantas, Paripiranga, Coronel João Sá, Adustina, Poço Verde e outros municípios vizinhos já está pronta. Em breve estará disponível para a venda. 

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020

Como se constrói um cangaceiro?

Corisco e o cangaceiro Vinte e Cinco, natural de Paripiranga.


Na grande obra de José Lins do Rego, “Fogo Morto”, narra-se a dureza da vida em uma terra dominada por coronéis e uma organização social quase que estamental na qual tornava-se praticamente impossível qualquer tipo de mobilidade social.
Narra de forma magnifica os desmandos dos poderosos cuja terra é seu domínio e as vidas que nela vivem têm quase que a mesma relação de posse. O mestre José Amaro é o símbolo disso. Vive em uma casa dentro do engenho Santa fé, do coronel Lula de Holanda. Tem por obrigação seguir os ditames do latifundiário a pretexto de ser expulso e não ter para onde ir. Apesar das habilidades de mestre no trato com o couro não tem posses, seus bens são sua tralha de trabalho, uma esposa e uma filha.
O mestre da vida real, Estácio de Lima, escreveu “O Mundo Estranho dos Cangaceiros” onde se debruça sobre as condições que levaram tantos homens e mulheres a enveredarem pelos caminhos do cangaceirismo a viver sem sorte vagando pelas caatingas.
Apesar de admitir fatores sociais e econômicos como os narrados em “Fogo Morto”, Lima (2006) analisa as condições de vida do sertanejo ligadas ao clima. Para ele as secas intermináveis que consumiam a plantação, o gado e a água de beber, arrematadas pelas enxurradas que se seguiam de uma só vez conferindo ainda mais crueldade àquelas pessoas, agia como uma trituradora de vidas. Assim, como em um moinho de seres humanos, o seu produto final era a construção de um indivíduo forte, capaz de suportar com relativa facilidade as brigas cruéis com a polícia.
O caboclo que emergia daquela terra dura não se importava com a morte, nem a sua. Muito menos as de seus inimigos. Afinal, morrer não poderia ser muito mais ruim do que viver. Foi dessa vida cruenta, comungada com a violência policial, a pobreza e o sofrimento, que nasceram lampiões, coriscos, Marias Bonita e tantos outros que ficaram marcados pela crueldade. Sua e contra si.
Não por acaso, em “Fogo Morto”, o Mestre José Amaro busca refúgio no bando do cangaceiro Antônio Silvino, não por acaso, Virgulino e tantos outros entram para o cangaço após a violência contra os seus, não por acaso os filhos das favelas adentram os caminhos do tráfico de drogas.

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2020

Objetos do século XIX são guardados por fatimense




Os objetos em questão pertencem a Dona Maria José Oliveira, moradora da fazenda Laje da Boa Vista, que nos recebeu para uma conversa em sua casa. Na oportunidade muitas histórias foram contadas e foram devidamente aproveitadas em artigos anteriormente publicados aqui no Blog HF.
Os objetos são um oratório, que pertenceu a sua avó, dentro do qual se encontra uma imagem sacra, aparentemente confeccionada em estilo barroco. De acordo com minhas pesquisas, a santa tem, pelo menos, duzentos anos. Os demais objetos (duas moedas) têm relação direta com o oratório na medida que tais moedas foram depositadas na edícula como oferenda.
Para traçar um perfil das moedas recorri ao pesquisador da numismática Paulo Roberto Rego. Este afirmou que a mais antiga, cunhada em 1869, e a mais recente, de 1893, não são muito valorizadas no mercado de moedas por terem sido confeccionadas em grande quantidade. Elas trazem gravados o brasão do império e a foto de D. Pedro II.
As moedas podem até não ter um grande valor monetário, contudo, tem um incomensurável valor histórico por ser mais um registro dos nossos antepassados que viveram durante o século XIX.


Moeda de 1893 com o brasão do império.

Oratório que abriga a imagem sacra do século XIX.
Moeda de 1869 com o busto de D. Pedro Segundo

Os clubes recreativos. Redutos da aristocracia.

Festa de Outubro de 1973 no Clube de Zé de Bilu.

Ainda na primeira metade do século XX, vigorava em toda a região nordeste o costume de manter clubes recreativos destinados aos bailes do setor mais rico da sociedade. A prática parece ter sido herdada ainda dos tempos imperiais, onde a alta sociedade dos grandes centros urbanos reunia-se em festas pomposas nas residências dos mais ricos.
            Os bailes do século XX também aconteciam em residências, contudo, decidiu-se construir espaços específicos, contando com estrutura necessárias para a realização dos bailes. Assim, eram erguidos galpões com palcos a fim de receber as atrações musicais. Isso ocorria tanto nos grandes centros urbanos como nas pequenas localidades interioranas.
            De acordo com Souza (2008), na então cidade de Cícero Dantas, que passou a assim chamar-se em 1915, o costume de reunir a alta sociedade em clubes despontou à partir de 1955, quando da construção do primeiro clube da cidade denominado Clube Recreativo Caimbés (CRC) que já contava com estatuto próprio a fim de reger a convivência entre seus membros. Já em 1962, ainda de acordo com o mesmo autor, foi organizada a Associação Recreativa Bonconselhense (ARB), que existiu até os anos 1990 com cede própria próximo ao Banco do Brasil.
            A ARB reunia os mais abastados do município e foi construída por iniciativa dos funcionários do Banco do Nordeste. Realizava eventos fechados e cumpria o ritual de separar pobres e ricos. Os bailes dos mais pobres realizavam-se nas praças ou residências, frequentemente ao som do forró e do pagode tocados por radiolas portáteis. Nos clubes, os eventos contavam com bandas que faziam sucesso regional, no caso da ARB apresentaram-se conjuntos musicais como Los Mexicanos, Orquestra Guanabara com Agnaldo Timóteo cantando e outros.
            Em Paripiranga, cuja composição aristocrática era mais complexa e antiga que a de Cícero Dantas, grandes clubes foram organizados. Já na década de 1940, a sociedade paripiranguense contava com seus clubes recreativos que serviam aos mais ricos e tinham também o objetivo segregacionistas.
            Na vila de Fátima, o primeiro clube é datado dos anos 1960. Embora mais modesto, o Clube de Zé de Bilu, que permaneceu funcionando satisfatoriamente até os fins dos anos 1990, reunia as famílias mais abastadas. As festas eram fechadas ao grande público. Existiu em três espaços diferentes. O primeiro onde hoje se localiza o supermercado Nossa Senhora de Fátima, depois onde hoje é o supermercado Bitencourth e, mais recentemente, nos fundos desse.
            De acordo com Dona Brinco, em entrevista concedida à Juan K. Menezes, as festas contavam com bandas como Los Guaranis e outras de atuação regional. Pelo que consta, a cantora Diana foi a atração mais famosa a se apresentar no Clube. Mulheres só entravam acompanhadas dos pais ou dos maridos, de modo que as moças de hábitos em desacordo com a sociedade patriarcalista e conservadora eram sumariamente barradas.
            As festas de rua na vila de Fátima eram raras, acontecendo somente nas festividades do natal. A diversão do grande público ficava à cargo das radiolas de pilha que embalavam as festas da juventude fatimense. Outra tendência que passou a vigorar entre os fatimenses foram as discotecas. Mais democráticas e abertas à toda a sociedade, as discotecas, por via de regra, não contavam com a apresentação de bandas, mas possuíam um sistema de som para animar os frequentadores.
            Em Fátima, tivemos a discoteca de Temir, chamava-se Dancin Days e funcionava onde hoje é a Farmácia São Lázaro e o famoso bar São Paulo.


Festa no Clube de Zé de Bilu.

Fachada da discoteca de Temir, onde hoje é a farmácia São Lázaro.

Obs: Esse artigo tem como coautor Juan K. Menezes.

domingo, 23 de fevereiro de 2020

João Maria não foi o único a lutar pela emancipação de Fátima




A história não é imparcial. Não é difícil encontrar situações nas quais pessoas são deliberadamente apagadas da história. Esse parece ser o caso de Antônio Menezes e as valiosas contribuições que o fatimense ofereceu durante sua vida ao povo dessa terra.
Por sentir que a vila era mal cuidada pela cidade de Cícero Dantas, foi um dos primeiros moradores da então Vila de Fátima a pleitear a emancipação. Pediu apoio ao Padre Elias e não obteve sucesso, buscou apoio entre a população local e encontrou resistência por parte de alguns.
De espírito público, buscava melhorias para a vila da forma que podia, assim, chegou a trazer médico para atender a população em sua propriedade, o Dr. Milton Dortas de Simão Dias atendeu fatimenses à convite de Antônio Menezes. Fez escola em sua casa na década de 1950, com a professora Jacinta de Cícero Dantas, conseguiu fazer com que o delegado de Cícero Dantas desse mais atenção à vila, diminuindo significativamente a violência.
Tamanha era a sua dedicação às causas dos fatimenses que a população fazia arrecadações em dinheiro para que pudesse viajar e arcar com as despesas das viagens à serviço de Fátima.
Sua liderança foi fundamental para unir a população local em torno da causa pela emancipação. Conseguiu convencer as lideranças a lutar pela causa e criou o sentimento no imaginário popular.
Após o plebiscito que sacramentou a separação de Fátima e Cícero Dantas, elegeu-se vereador e chegou a ocupar a presidência da câmara na primeira gestão, em 1987.
Isto posto, é possível concluir que João Maria foi um dos personagens da emancipação, não necessariamente o único. É preciso fazer justiça à pessoa de Antônio Menezes e suas inúmeras contribuições para a cidade. Não se trata, contudo, de tentar diminuir a figura de João Maria de Oliveira, trata-se, isto sim, de buscar, baseado nos fatos, corrigir um erro histórico ao trazer a luz a história como de fato aconteceu.

Esse artigo tem como coautor Juan K. Menezes.

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2020

Quem era o Cadeirudo de Fátima?

O caminhar do cadeirudo


Em 1997, estava no ar a novela A indomada, de Aguinaldo Silva, veiculada na TV Globo. Na trama, um personagem curioso e ao mesmo tempo assustador aparecia nas noites de lua cheia para atacar as mulheres. Com um andar bastante peculiar e trajado com roupas folgadas e chapéu, o Cadeirudo provocava medo nos telespectadores sempre que aparecia na tela. No final da novela, seria revelado que o tenebroso Cadeirudo era a personagem Lurdes Maria (Sônia Paula), uma das beatas mais fervorosas da cidade.


Mistério revelado na novela

Evidentemente as pessoas se assustavam com o personagem da TV, mas nada seria tão assustador para as mulheres de Fátima, ou de qualquer outra cidade, do que se deparar com o próprio cadeirudo em carne e osso.
Foi justamente o que aconteceu em Fátima. Quem viveu aquele final dos anos 1990 por aqui se lembra do furdunço. Em uma noite, não necessariamente de lua cheia, apareceu pela primeira vez na cidade aquele personagem assustador. Surgia sempre de um beco escura e caminhava em direção às mulheres que passavam, fazendo-as correr desesperadamente.
Naturalmente os comentários se multiplicaram, alguns diziam não se passar de uma brincadeira, outros afirmavam ser uma entidade sobrenatural. Muitas mães proibiram seus filhos e, principalmente, suas filhas de saírem à noite com medo daquela figura horripilante com chapéu na cabeça que surgia das sombras.
Mas o cadeirudo fatimense, felizmente, e diferente daquele da novela, era inofensivo. Não passava de uma peraltice de um garoto que gostava de pregar peças. Tudo não passava de uma brincadeira muito bem elaborada do adolescente Diogo Maurício Belens, ou Dioguinho, como ainda é conhecido.
Em uma conversa animada, ele me revelou que decidiu imitar o cadeirudo da novela combinado com alguns amigos mais próximos. Para ficar parecido, arrumou uma calça, uma camisa social e um chapéu. Nas noites em que decidia aprontar, ficava com um grupo conversando na “calçada alta” com a roupa de cadeirudo pronta, quando avistava as “vitimas” vestia o traje e ficava em um canto escuro esperando a hora certa de agir, quando as meninas passavam ele saía do esconderijo com a cabeça baixa para não ser reconhecido e andava na direção delas imitando o pitoresco caminhar do personagem. Aquilo causava grande pavor na mulherada  que saiam correndo e gritando desesperadamente.
Diogo ainda fez a brincadeira por algumas vezes, mas o caso já ficava famoso demais na cidade e ele resolveu parar. Felizmente ninguém se machucou e nem foi preciso envolver a polícia para sanar o mistério. Muita gente lembra desse caso, contudo, uma quantidade considerável de fatimenses, sobretudo os mais jovens, não conheciam a história, até agora.

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2020

O padre Elias manda derrubar a igreja da Vila de Fátima

Moças posam para foto em frente à capela construída por Chico André


1967, a igreja da então vila de Fátima era uma pequena capela, erguida anos antes, por volta dos anos 1950 por Francisco André dos Reis, Chico André, Irmão de Tóta André. O padre Elias, Hoje, Monsenhor Elias, deu uma atribuição ao fatimense Antônio dos Santos Menezes, conhecido como Antônio Menezes. As “ordens” do vigário eram para que o agricultor organizasse a comunidade da vila para erguer uma igreja maior para a crescente população.
Em entrevista concedida ao pesquisador Juan K. Menezes no dia 17 de fevereiro de 2018, Antônio Menezes relata que o padre, que substitui o Padre Renato Galvão, sentia-se demasiadamente incomodado com a quantidade de fiéis que precisavam ficar do lado de fora da igreja em decorrência do seu diminuto tamanho.
Diante do importuno, o Padre deu a ordem para que os fiéis demolissem a pequena capela para a construção de uma maior. O padre Renato Galvão, que à época atuava em Cícero Dantas, mostrou-se cético com a tarefa. De acordo com seu Antônio, ale teria afirmado que em dois anos a construção deveria alcançar pouco mais de um metro de altura, tamanha era a descrença do Padre.
Seu Antônio conta ao entrevistador que relutou em aceitar a tarefa, mas o Padre Elias insistira que ele tomasse a frente e levasse adiante o projeto. Terminou cedendo aos apelos do vigário e a igreja foi demolida. A partir daí o que ele relata é uma verdadeira odisseia composta por leilões, arrecadações e doações para a construção. Segundo seus relatos, bois, bodes e outros itens foram leiloados para arrecadar os fundos.
Os leilões e as diversas novenas foram gerando dividendos para a compra dos materiais, outros, entretanto, eram retirados das redondezas como as setenta carradas de pedras retiradas do terreno de Elias Pereira para a confecção dos alicerces. Nesse última caso, o material não foi cobrado, apenas a diária dos carreiros que manipulavam os carros de boi até a obra (segundo as lembranças de seu Antônio, alguns dos carreiros foram: Ele próprio, Dão Simplício e Antônio Piroca).
E assim, para o espanto do Padre Renato Galvão, a obra fora construída. Segundo seu Antônio, em menos de seis meses. Houve missa na igreja nova celebrada pelo Padre Elias para a felicidade dos fiéis que se empenharam para a construção do templo de sua fé. É perceptível nas palavras de Antônio Menezes o orgulho por ter tido a incumbência de encabeçar a obra de construção da nova igreja da Vila de Fátima.

Igreja após a Ampliação


Este artigo tem como coautor Juan k. Menezes.

terça-feira, 18 de fevereiro de 2020

Revista em quadrinhos HISTÓRIAS DO CANGAÇO avança.


A revista em quadrinhos que visa contar as histórias do cangaço em Fátima e região está sendo finalizada e em breve estará disponível aos leitores. Com ilustrações de Mateus Queiroz. 

A “Pesadela” já te pegou no sono?

Foto Ilustrativa.


Todo fatimense já ouviu falar no mito da “pesadela”, segundo o qual, os desafortunados que cultivam o hábito de dormir de barriga para cima estão expostos ao risco de serem atacados por um estranho ser mítico que o paralisa e o tortura durante o sono, fazendo-o ter terríveis pesadelos.

De acordo com Cornélio (1927), na obra Conversas ao pé do Fogo, onde aborda grande parte das temáticas relativas ao folclore brasileiro, esse mito, que em outras regiões do Brasil é conhecido com a “Pisadeira”, é oriundo da terrinha (Portugal), a obra afirma ainda, erroneamente, que essa lenda é encontrado apenas em São Paulo e Minas Gerais, contudo, a sabedoria popular do sertanejo se encarregou de arredondar a nomenclatura para “Pesadela”, o que pode ter causado a confusão na hora de mapear a sua incidência.

A pesadela seria, portanto, uma mulher de aparência horrível, com unhas enormes que costuma sentar no peito de quem dorme de barriga pra cima, causando uma sensação de aperto no peito e terríveis pesadelos durante o sono.

Mais um aspécto da nossa cultura que nos ajuda a contar a história do nosso povo.


Fotos dos anos 1960 mostra reforma da Igreja Matriz


A foto faz parte do acervo da biblioteca municipal. De acordo com informações, a reforma em questão foi encabeçada por Antônio Menezes, Francino e Alexandre Norberto, homens de posses que frequentemente lideravam movimentos de ampliação e melhorias na Igreja.
Na imagem podemos observar a frente da Igreja à partir da Travessa São Francisco Diassis, ainda sem pavimentação, próximo à casa de Otávio Gato (já falecido). É igualmente perceptível, a dispeito da baixa qualidade da fotografia, que o cruzeiro já existia e que a fachada do templo religioso mudou pouco desde então, o que não pode ser notado no restante da construção que passou por diversas ampliações após o período retratado.

Obs: Esse texto teve a importante colaboração do pesquisador Juan Kléber Menezes.

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2020

Traçado da estrada real que passava em Fátima

Foto: Google Earth


Á partir de informações colhidas ao longo dessa pesquisa, foi possível concluir o traçado mais provável do principal ramal da estrada real que passava por Fátima.
Como já abordado em artigos anteriores aqui no blog HF, a denominação ESTRADA REAL designava, ainda nos tempos do império, os caminhos pelos quais era permitido o transito de mercadorias, foi uma medida de combate ao contrabando adotada pelo império, tal denominação povoou o vocabulário popular até meados do século XX. No caso de Fátima, esse era o principal caminho utilizado pelos tropeiros que faziam o abastecimento das vilas até o surgimento do automóvel nesse região na segunda metade do século XX.
O traçado que aparece na imagem de satélite está demarcado à partir da fazenda Lage da Boa Vista, ligando essa região ao tanque do São Paulo Velho, Passando pelo loteamento Vila Madalena, pela Rua Raimundo Oleiro indo em direção às aguadas conhecidas como Nação e Sítio. Vale lembrar que todos esses corpos d’água são bastante antigo, foram cavados ainda no século XIX com mão de obra escrava. É possível que o traçado da estrada real tenha sido esse justamente em função dos tanques onde os tropeiros podiam matar a cede dos animais e abastecerem seus reservatórios para seguir viagem.
Pela imagem percebe-se que a estrada apenas circundava a atual zona central da cidade, há relatos que outros ramais davam acesso, à partir da referida estrada, à atual praça Ângelo Lagoa onde a feira sob o barracão acontecia semanalmente. Ainda não está claro o destino da estrada que segue na direção da cidade vizinha de Adustina. Não é possível dizer ainda se esta passava por Adustina e depois seguia para Paripiranga ou se havia um desvio no caminho.

domingo, 16 de fevereiro de 2020

O “Bar São Paulo”



Ponto de encontro da juventude fatimense entre os anos 1980 e 1990, o Bar São Paulo foi ícone de ambas as gerações, embora tenha atingido o seu auge em meados dos anos 90. Criado por um torcedor ferrenho do São Paulo (Milton), o espaço consistia em um pequeno bar na parte da frente e um salão ao fundo onde os frequentadores iam para dançar. Era todo ele decorado com as cores do time de futebol que lhe empresta o nome e com figuras diversas com uma tinta que reagia à luz negra do ambiente.
O Bar São Paulo passou posteriormente para Adelmo, corintiano ferrenho que, a despeito da rivalidade futebolística, manteve o nome tradicional. Rígido com os horários, Adelmo fazia rondas no salão convidando os menores à saírem do espaço assim que chegava as dezoito horas. Sempre com a mesma abordagem, batia no ombro daqueles com aparência mais jovem e dizia: “Vamos lá?”, todos já sabiam que não poderiam mais ficar pois o horário noturno só era permitido por lei para os adultos.
Para a juventude atual, pode parecer estranho, mas era essa a rotina de todas as quartas, sábados e domingos nos anos 1990. Diversos ritmos musicais ecoavam ali. Pagode, Axé, forró, Reggae e outros. Pontualmente as dezoito horas ouvia-se as “músicas lentas” (românticas), geralmente ritmos internacionais que embalavam os casais dançando juntinhos. Muitas paqueras, namoros e casamentos tiveram início ali, naquele salão do Bar São Paulo.
Algumas lendas não deixaram de ser criadas pela imaginação do fatimense. Em virtude das tradições religiosas, dizia-se que quem olhasse por baixo das próprias pernas dentro do salão viria “O cão”, o capeta, o cramulhão. Também por isso, muitos pais não queriam que seus filhos menores frequentassem o local, mas quem nunca quebrou as regras e entrou escondido no Bar São Paulo?
Com o passar do tempo, as novas gerações não se interessavam mais pela danceteria, o espaço foi ficando cada vez mais vazio e acabou fechando, deixando saudade e muitas histórias daqueles frequentadores que, como eu, esperavam ansiosamente o domingo para ir ao Bar São Paulo com a “roupa de domingo”, dançar, ver os amigos e paquerar como todo e qualquer jovem.

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2020

Você já ouviu falar da Rua do Mela o Bico?





Nas imediações da atual Avenida João Maria de Oliveira, mais precisamente entre o Hotel Pôr do Sol e o Supermercado Bitencourt, funcionava o curral onde se abatiam os animais para o consumo da população.
Naquela parte da cidade, por volta dos anos 1950, via-se as tarefas da lida oriunda desta atividade, costume que, aliás, perdurou até meados dos anos 1980. Algumas mulheres se prestavam ao duro trabalho de limpar as vísceras para serem vendidas no barracão que ficava na atual Praça Ângelo Lagoa.
As mulheres que ganham a vida com esse ofício são, até os dias de hoje, conhecidas como “fateiras”. Atividade de baixíssima remuneração, exige duro labor à beira do fogo de lenha a fim de escaldar as partes menos nobres do boi. Comumente, os locais que desenvolvem tal atividade passam ao observador um aspecto de sujeira e pobreza extrema, o que faz das fateiras pessoas demasiadamente descriminadas na sociedade.
É possível que o nome atribuído à rua sem pavimentação e com casas muito modesta (Mela o Bico) tenha sido uma forma pejorativa de taxar aquela local extremamente desvalorizada da cidade. Quem e porquê criou esse nome é uma informação que não temos. O certo é que aquela área da cidade mudou muito com o passar dos anos, as casas simples viraram comércio, tornando aquele ponto bastante valorizado. Um dos metros quadrados mais caros da cidade atualmente.
A menina que aparece na foto é Valdineide Bispo, Dê de Bispo. Posicionada em frente à atual clínica Clotíldes Batista (à época, residência da sua família), ao fundo, onde vemos uma caminhonete, hoje se encontra a Padaria de Zé Beto, a casa sem reboco à direita fica onde hoje é a Farmácia Mais barato.
Mais um registro bacana da nossa história cedido pela personagem da foto ao pesquisador Juan Kléber que gentilmente cedeu para o Blog HF.

Quadrinhos História do Cangaço em andamento

Labareda, por Matheus Queiroz


A revista Histórias do Cangaço está sendo preparada com muito cuidado e dedicação. Será uma revista em quadrinhos dedicada à contar as ações de cangaceiros no agreste da Bahia e Sergipe. As histórias serão contadas com base em fatos reais do cangaço.

terça-feira, 11 de fevereiro de 2020

A seca que assolou o semiárido baiano em 1932

Retirantes: Portinari


No transcorrer desses mais de dois anos de pesquisa historiográfica em nossa região, diversos idosos foram entrevistados. Boa parte desses foram testemunhas oculares da famigerada “seca de 32”, como costumam nominar. Outros, ainda, são descendentes em primeiro ou segundo grau daqueles que enfrentaram terrível e penoso ano de 1932.
            A região semiárida nordestina é envolta pelo chamado polígono da seca, área na qual as chuvas são irregulares e os longos períodos de estiagem são cíclicos. Há um certo consenso entre os pesquisadores do clima acerca do principal culpado dessa lástima, o fenômeno El Niño.




No campo político, Juracy Magalhães ocupava o cargo de governador da Bahia e Getúlio Vargas era o presidente do país. As políticas públicas no combate à seca são historicamente ineficientes. Comumente reduzem-se à construção de açudes e a assistência imediatista dos carros pipas (esses últimos, um quadro bem mais atual, recurso que não estava disponível na época). Meras soluções paliativas que na prática aprisionam o eleitor a votar em determinados grupos políticos. Entretanto, naquele ano, o governo federal tomou medidas mais eficazes, como a sustentação dos preços em um patamar mais aceitável e a criação de frentes de trabalho com mão-de-obra local para o combate à seca. Provavelmente, tais medidas amenizaram os efeitos da estiagem, mas não evitaram um incontável número de sertanejos mortos.
            Os relatos de quem vivenciou o período, dão conta do sofrimento da nossa gente. A água escassa era tratada como ouro (não havia qualquer tipo de abastecimento, a única água disponível era em aguadas escavadas pelo governo ou particulares), mal dava para beber e cozinhar, os rebanhos foram praticamente dizimados, as plantações também. Em algumas regiões comia-se biscoitos de milho moído aquecidos no fogão de lenha, o feijão armazenado em vasos de um ano para outro era a principal fonte de alimento, muitas famílias cozinhavam diariamente uma panela de feijão, tarefa comumente atribuída a mãe de família, e, para obter a carne, os demais membros saíam pela manhã para caçar ou pescar a fim de obter a mistura se a sorte assim permitisse.
            Muitos desses relatos foram colhidos, como dito, em diversas entrevistas. Seu Raimundo, morador do formigueiro me relatou a morte de muitas pessoas por epidemias incomuns e em consequência da fome, a mais brutal das pestes.

Em Fátima, nas proximidades da laje da boa vista, uma capelinha (estrutura erguida para demarcar o local do falecimento de alguém) ainda existe como testemunha daquele flagelo. Segundo Dona Maria José, a estrutura marca a morte de uma mulher, de quem o nome nunca se soube. A caminhante que seguia viagem solitária pela estrada real não trazia alimento nem água entre seus pertences, caiu sem vida à beira da estrada e é provável que tenha sido sepultada ali mesmo por tropeiros. Anos depois, o proprietário do terreno resolveu erguer a capelinha em homenagem àquela pobre criatura, vítima da fome.
Foto: Édson Nascimento

            As secas que se abatem por essa região são cíclicas, retornam a cada período de 30 anos. Cantada em verso e prosa pelos artistas da terra, já vitimou milhões de nordestinos. Hoje seus afeitos são amenizados devido, sobretudo, a existência da água encanada em parte significativa dos lares, mas seus afeitos ainda são terríveis para a agricultura e a pecuária da região.

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2020

Fuga de escravizados em Fátima e região

Disponível em: http://www.muitointeressante.com.br/blog/a-doenca-que-fazia-os-negros-fugirem-da-escravidao


O processo de colonização que os portugueses implantaram no Brasil era demasiadamente dependente da mão-de-obra escrava. Foi o braço de africanos trazidos da sua terra natal para a América Portuguesa (Brasil) que construiu a pátria que conhecemos hoje.
A escravidão brasileira não carece de romantização. As histórias que contam de uma relação pacífica entre escravos e senhores de escravos é exceção e, com efeito, visam suavizar as condições brutais às quais os negros eram submetidos durante os mais de três séculos de regime escravista no Brasil.
Homens, mulheres e crianças eram submetidos, para ficar em alguns poucos e espaços exemplos, aos mais diversos castigos físicos e psicológicos como: Marcação à ferro, chicotadas, ficavam confinados em espaços impróprios e desconfortáveis, abusos sexuais e tantos outros abusos.
Uma das principais formas de resistência, não a única, empreendida por aquelas pessoas era a fuga. Sempre que havia a possibilidade, os escravizados buscavam escapar em busca de uma vida um pouco mais digna. Muitos procuravam fazendas onde os escravos eram menos judiados e imploravam asilo para os senhores, outros, contudo, preferiam viver no meio do mato nos chamados quilombos.
Na região de Fátima e municípios vizinhos não há registro de quilombos formados à partir de escravos foragidos. Temos, em Fátima, uma comunidade quilombola, a Serradinha, que foi formada por descendentes de escravos vindos da região de fronteira com Sergipe. (Sobre a Serradinha, aliás, abordaremos esse tema específico em outro artigo aqui no Blog HF em outra oportunidade, citando um belo trabalho de acadêmicos do curso de história da Unit feito junto à referida comunidade).
Isso não significa, sobremaneira, que não houveram inúmeras e notórias fugas de escravos aqui na região. Isaura Borges, bisneta de dono de escravos, relatou em entrevista concedida aos professores Maria São Pedro e José Domingos, as fugas dos escravos do dono da fazenda Maria Preta, Severo Correia. Diversos moradores mais antigos da cidade lembram da crueldade com que Severo tratava o seu plantel.
Segundo relatos, havia, até pouco tempo, nas proximidades da região do Pisa-Macio, uma árvore (pé de caixão, como é conhecida a espécie entre os populares) que servia de tronco para os castigos dos escravos do fazendeiro que não hesitava em mandar castigar os seus negros por muito pouca coisa.
A consequência mais natural dos maus tratos de Severo eram as fugas dos seus escravos. Ainda segundo relatos, ele precisou ir por diversas vezes à Jeremoabo para resolver na justiça (Fátima, Cícero Dantas, Adustina, Paripiranga e demais municípios vizinhos compunham a comarca de Jeremoabo na época) para resolver questões de escravos fugidos e capturados por outros fazendeiros.
As fugas eram brutalmente combatidas. Com frequência, os fujões eram severamente castigados para que servissem de exemplo para os demais. Além disso, os negros fugidos eram frequentemente caçados com violência pelos capitães do mato.
Como não poderia deixar de ser, essa nossa região também tem registrada em sua história as fugas de escravos tão comuns em toda a colônia. Onda há opressão sempre haverá resistência.

Quadrinhos - Histórias do cangaço


Esse é o esboço inicial feito pelo ilustrador Matheus Queiroz dos personagens da revista em quadrinho HISTÓRIAS DO CANGAÇO. Essa revista é um projeto que venho desenvolvendo nos últimos meses. A publicação terá como principal objetivo contar as histórias de cangaceiros em toda a nossa região. O formato da revista, bem como sua linguagem e ilustrações então sendo feitos visando a possibilidade de uso do seu conteúdo em sala de aula do ensino fundamental e médio.

domingo, 9 de fevereiro de 2020

A Caipora e os segredos da caatinga

Disponível em: https://www.artstation.com/artwork/e2VBD


A atividade da caça é, com frequência, envolta por um misticismo muito forte. A despeito de ser, hoje, uma prática proibida. No passado, muitas pessoas sustentaram suas famílias através da caça.
Atualmente, com o avanço inclemente do desmatamento sobre toda a região do semiárido baiano e sergipano, para ficar somente neste exemplo, os animais que costumavam ser abatidos para o sustento humano estão cada vez mais raros. Um contraste com a abundância de outrora narrada pelos antigos caçadores.
A caça é, por via de regra, praticada por pessoas de hábitos simples e de pouca instrução. Seus adeptos eram pessoas religiosas que desenvolviam verdadeiros rituais supersticiosos antes e durante as caçadas. Certas palavras e gestos eram proibidos no meio do mato, “sinais” da natureza eram interpretados e carregados de significados. Avisos do espectro sobrenatural.
Dentre as entidades do mato, o mais famoso entre a nossa gente foi a caipora. Sua origem é a mitologia tupi-guarani. Oriunda das sociedades indígenas antigas, é esta uma entidade visceralmente ligada à caça. Segundo a tradição indígena que perdura até os dias de hoje, a caipora (ou “O” caipora, como é citada em outras regiões) é um ser cujo corpo é coberto de pelos que habita as matas. Protetor dos animais, costuma pregar peças em caçadores que abatem mais animais do que precisam para sobreviver. Dá pistas falsas e costuma “ariar” (desorientar) as pessoas deixando-os perdidos no meio do mato.
O mito da caipora é uma tradição muito antiga que perdura no imaginário popular do sertanejo até os dias de hoje, provocando medo entre a gente simples e, ao mesmo tempo, servindo como uma conexão entre os habitantes originais dessas terras e a contemporaneidade.

Cangaceiros sem cabeça

Cabeças dos 11 cangaceiros mortos em Angico
Aqueles que se interessam minimamente por história, neste caso, história do cangaço, vão lembrar com relativa facilidade de um macabro costume das lutas entre cangaceiros e volantes.
Era comum que os soldados, ao matar um cangaceiro (a) decepassem as cabeças dos bandoleiros, geralmente a golpes de facão. Existem diferentes versões entre os estudiosos do cangaço para justificar tal prática. A versão mais aceita, contudo, é que o costume se daria em virtude da necessidade de provar para autoridades e a sociedade como um todo que o feito (o assassinato de um cangaceiro) tinha sido concretizado.
Na impossibilidade de levar o corpo inteiro para a cidade ou vila mais próxima (é bom lembrar que volante e cangaceiros, por via de regra, viajavam à pé) os policiais simplesmente cortavam as cabeças dos cangaceiros e levavam o macabro troféu. Outra parte do ritual que comprava esta versão é a fotografia de registro. Na grande maioria dos casos, as cabeças eram fotografadas prontamente.
Na semana passada, eu e o radialista Carlos César, visitamos o senhor Sebastião, morador do formigueiro, hoje com quase cem anos. Seu Sebastião, muito lúcido e altivo, nos contou que foi caçador durante a maior parte da sua vida, afirma ter criado os seus 14 filhos à partir desse ofício.
Por diversas vezes, este caçador perambulou pelas proximidades do Jardim, distrito que fica na fronteira entre as cidades de Adustina e Coronel João Sá. O local foi palco de “um fogo” (luta entre cangaceiros e volantes) entre o bando de Labareda e a volante do tenente Odilon Flor. No combate, morreram Mariquinha, Mulher de Labareda e mais dois cangaceiros. Como era de costume, as cabeças dos três foram decepadas e os corpos enterrados ali mesmo.
Pensar em pessoas cujas cabeças eram cortadas leva, com certa naturalidade, as pessoas a criarem toda uma mística em torno dos fatos e neste caso não seria diferente.
Seu Raimundo, entre as suas diversas histórias de uma vida longa, afirma categoricamente que toda a região ainda hoje é assombrada pelos espíritos dos cangaceiros mortos quase cem anos atrás.
Segundo ele, certo dia, estava caçando com outro companheiro quando deparou-se com o fantasma de um cangaceiro perambulando pela caatinga sem a cabeça. Afirma, contudo, que não sentiu medo do espectro, mas que seu companheiro de caça nunca mais voltou à referida região.
Não se trata aqui de acreditar ou não no fato, trata-se, isto sim, de compreender que a brutalidade dos tempos dos embates entre cangaceiros e volantes acabou por criar toda essa mística entre a gente simples dessa nossa região. Seu Sebastião é só mais uma pessoa sensibilizada, em sua simplicidade de homem do campo, por toda aquela violência dos tempos de Lampião em seus cangaceiros.

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2020

Manual Didático do Professor de História



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Por que Fátima era chamada de Mocó?





Em meados dos anos 1930, a pequena localidade que posteriormente viria a ser a atual cidade de Fátima era conhecida como Mocó.
O Mocó é um roedor de pequeno porte da família Caviidae, que vive no bioma caatinga.
De pelagem cinzenta, esse animalzinho alimenta-se de cascas de árvores, brotos, folhas e frutos.
Em entrevista com José Nonato de Oliveira, ou seu Nonato, como é conhecido, ele nos afirmou que, nas primeiras décadas do século XX, este animal era encontrado em abundância na área acidentada que fica nas proximidades da torre de Fátima de propriedade, hoje, da família de José Ferreira Sobrinho (Zé da Barreira), já falecido.
Apreciado pelos caçadores da época, os Mocós eram abatidos aos montes no referido local e foram os próprios homens que costumavam caçar na região (Hoje já bastante povoada) que apelidaram toda a área de Serra do Mocó. Ao mesmo tempo, as esparsas casas que compunham o que viria a ser a atual Praça Ângelo Lagoa (a mais antiga da cidade) receberam também a mesma alcunha.
E foi esse o motivo da atual cidade de Fátima ter tido, no passado, esse nome. Posteriormente passou a chamar-se, de acordo com Borges (2009), Monte Alegre, Monte Alverne e finalmente Fátima.
A palavra mocó é hoje considerada ofensiva por boa parte dos fatimenses.

terça-feira, 4 de fevereiro de 2020

Ilustração de Labareda

Ilustração: Mateus Queiroz

Diversão da juventude fatimense nos anos 1970



Os jovens têm sempre a necessidade de se divertir. Em cada época, a juventude cria as suas formas de diversão de acordo com as possibilidades econômicas e os costumes típicos de cada período e lugar.
            Nos anos 1970, muitos jovens fatimenses, sobretudo homens, precisavam viajar em busca de trabalho e oportunidades que a pequena Vila de Fátima não tinha para oferecer. O destino era quase sempre a pujante cidade de São Paulo. No auge do processo industrial, entre as décadas de 1950 e 1970, nordestinos de todos os estados precisavam realizar esse êxodo rural em direção aos grandes centros urbanos fugindo da seca, da pobreza e desemprego.
            Mesmo longe da sua terra natal havia sempre a esperança de voltar, mesmo que fosse por um curto período para rever os parente e amigos.
            As viagens de férias, com frequência, eram oportunidades perfeitas para festejar. Um costume bastante peculiar, que não pertencia somente à Fátima, era trazer uma radiola portátil, que funcionava com pilhas para embalar as festas nas casas de alguns moradores.
            O poeta Jessier Quirino afirma que as radiolas eram instrumentos de conquista e essa informação foi confirmada a mim pelo fatimense Joselito Amaral, segundo o qual, chegar de São Paulo sem portar uma radiola era quase motivo de vergonha para os regressos.
            Ao chegar em casa, feitas as devidas confraternizações com a família mais próxima, o costume era pegar a radiola, comprar pilhas, colocar os discos de vinil embaixo do braço e sair em direção a casa de algum conhecido para iniciar o baile.
            As festividades duravam quase sempre a noite inteira, os jovens bebiam e dançavam ao som dos cantores que faziam sucesso na época, as paqueras e os namoros eram uma consequência. A festa só chegava ao fim quando as pilhas começavam falhar e distorcer as vozes dos cantores, era o sinal de que a festa estava acabando.
            Contar o costume de trazer radiolas cultivado pelos fatimenses nos anos 1970 foi uma forma que encontrei de capturar esse momento peculiar da história da nossa gente.

Radiola portátil