O foco desse blog é a pesquisa da história do Sertão baiano.

segunda-feira, 23 de março de 2020

O privilégio de ter sido criança na Praça Ângelo Lagoa dos anos 1990

Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=y4mkalKPg9U

Em meados de 1992 a minha família trocou a casa onde morávamos, na Avenida Nossa Senhora de Fátima, pela velha casa construída nos anos 1930 na Praça Ângelo Lagoa. Me lembro bem do estranhamento que me causou aquela cumprida casa antiga, de telhado baixo e uma fachada com cerca de cinquenta centímetros de espessura. “Feita para suportar tiros de fuzil de cangaceiros!”, era a teoria do meu pai.
            Eu não sabia ainda, mas aquela mudança faria toda a diferença nos anos subsequentes da minha infância. Ali fiz bons e numerosos amigos que cultivo até os dias de hoje, à despeito do distanciamento que a vida, as atividades profissionais e o tempo nos impõe.
            As brincadeiras daquela geração seriam demasiadamente estranhas às crianças de hoje. Não quero aqui me render à sentimentalismos e nostalgia tola. O que desejo, isto sim, é “pintar um retrato” daqueles anos juvenis vividos na praça do jardim, ou rua velha, como alguns prefeririam.
            Ali brincávamos de MÃE DA LUA que Consistia em um jogo de paciência e coragem, pois a punição para quem vacilava era severa. Dois campos eram estabelecidos e ficavam à cargo de duas equipes rivais. Para derrotar o oponente, era preciso atravessar o campo “inimigo” e retirar uma bandeira (representada, com frequência, por um galho de árvore pequeno) que ficava ao fundo, muito bem protegido pelos jogadores da outra equipe. Quem fosse apanhado dentro do campo adversário levava murro nas costas até que conseguisse se desvencilhar e voltar ao seu campo.
            CHUTA LATA era outra atividade divertida onde um ficava na busca dos demais que se escondiam pelas imediações.  Ao avistar um dos participantes o buscador deveria bater a lata no chão e falar o nome do avistado em voz alta, o objetivo dos que se escondiam era chutar a lata antes de ser descoberto. Quando isso acontecia o buscador perdia e precisava repetir o processo.
            Havia também as variações do futebol como TRAVINHA, onde traves ou metas pequenas eram posicionadas sem goleiro e dois times disputavam quem fazia mais gols. TOQUINHO era a variação do futebol praticada no jardim, quando o vigia não estava olhando ou havia sido demitido pela prefeitura. Um goleiro guardava a meta enquanto dois jogadores ficavam à sua frente tocando a bola de um lado para o outro. O objetivo era fazer três gols, neste caso o goleiro perdia e cedia espaço para outro que aguardava de fora, mas se o goleiro conseguisse segurar a bola dentro da área, o jogador que tocou por último trocava de lugar e passava a defender no gol. No jogo denominado SALÃO, um goleiro ficava na guarda enquanto dois jogadores tocavam a bola na frente, parecia muito com o Toquinho, entretanto só valia o gol se a bola não tocasse o chão antes de ser chutada. A bola pra fora eliminava o jogador. Por vezes brincávamos de LANÇAMENTO, onde um jogador cruzava a bola para um pequeno grupo que deveria tentar o cabeceio.
            Diz a velha máxima que filho de pobre se diverte com qualquer coisa. E, nesse caso, parece ser a mais pura verdade. Qualquer objeto virava um brinquedo, uns mais inusitados que outros. Assim, um pneu de carro com água dentro e dois cabos de vassoura virava, com um pouco de imaginação, um possante automóvel, um vasilhame de água sanitária com uma aba na lateral e um cordão para puxar virava um divertido brinquedo, assim como um pedaço de tábua e alguns rolamentos de carro eram convertido no mais emocionante dos carros de corrida. Que sufoco era controlar aquele carro nas curvas do jardim!
            E quantas outras formas de diversão inventávamos. Formiguinha, bandeira, Rasga meia, pula corda, carro de lata, bola de gude, bingo com tampa de refrigerante e uma infinidade de coisas que nos fizeram crescer felizes naquele ambiente saudável e acolhedor da Praça Ângelo Lagoa.

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