Família Oliveira, pioneiros.
Imagem ilustrativa |
O
sobrenome Oliveira ocupa um lugar significativo na história social do sertão de
Cícero Dantas, Fátima e região, compondo uma linhagem que, embora não figure
com títulos de nobreza como os Dantas, se projetou como elemento fundamental na
engrenagem do poder local. Os registros mais antigos, oriundos do Tombo da Casa
da Torre, já indicam a presença de diversos Oliveiras como posseiros e
proprietários de terras desde o início do século XIX. Nomes como João Felix de
Oliveira (1826, Barroquinha), Bernardino Francisco de Oliveira (1824, Jeremoabo),
José Antonio de Oliveira (1815, Arraial), Antonio Joaquim de Oliveira (1855,
Caburé) e Manoel Ferreira de Oliveira (1814, Itapicuru) atestam que a família
detinha propriedades em áreas estratégicas para a criação de gado e circulação
comercial. Isso já os coloca como parte de um grupo social ligado à economia do
couro, essencial para a formação da sociedade sertaneja oitocentista.
Nas
últimas décadas do século XIX e nas primeiras do século XX, os registros
paroquiais de matrimônio revelam a forte ramificação e entrecruzamento
matrimonial dos Oliveiras. Foram dezenas de casamentos envolvendo o sobrenome,
tanto em noivos e noivas quanto em testemunhas, entrelaçando-os
sistematicamente com as principais famílias da região: Dantas, Reis, Correia,
Santana, Carvalho, Andrade, Castro e Nascimento. Esse dado é revelador: os
Oliveiras não se limitavam a reproduzir sua linhagem de forma endogâmica, mas
se consolidavam como uma espécie de tronco mediador, apto a costurar alianças
que reforçavam a malha social do sertão. A frequência com que surgem como
testemunhas — função reservada a pessoas de confiança e prestígio — reforça sua
autoridade comunitária e o reconhecimento público de sua importância.
Essa
presença simultânea em terras e matrimônios cria um duplo eixo de poder: de um
lado, a propriedade fundiária como base material de influência; de outro, as
alianças familiares que garantiam legitimidade social e acesso a redes de
proteção. Não surpreende, portanto, que ao longo do século XX os Oliveiras
também figurem nos registros criminais, especialmente em Salvador, mas quase
sempre com raízes no sertão. Nomes como Ângelo Pereira de Oliveira (1922), Adalberto
Maurício de Oliveira (1923), Miguel Mendes de Oliveira (1935), Carlos Dantas
Mendes de Oliveira (1941) e Manoel Bispo de Oliveira (1938) demonstram não
apenas a permanência do sobrenome, mas também sua inserção em ambientes de
disputa política e social. O caso de Carlos Dantas Mendes de Oliveira, que
reúne os sobrenomes Dantas e Oliveira, é emblemático, pois mostra a
continuidade das alianças matrimoniais entre as duas famílias, agora refletida
até nos processos criminais, o que evidencia que esses conflitos estavam
relacionados mais à esfera do poder do que à marginalidade social.
As
análises da dissertação sobre o Barão de Jeremoabo (Cícero Dantas Martins) um
texto de Álvaro Pinto Dantas de Carvalho Júnior, ajudam a compreender melhor
esse lugar ocupado pelos Oliveiras. O barão, chefe político da região,
sustentava seu poder em uma rede de famílias ligadas pela terra, pelo casamento
e pela fidelidade pessoal, estruturando um sistema de coronelismo típico do
sertão nordestino. Dentro dessa lógica, os Oliveira aparecem como atores de
segunda linha da elite, não detentores de títulos nobiliárquicos, mas
indispensáveis ao funcionamento do sistema, servindo como mediadores entre os
grandes chefes e a comunidade. Seus vínculos matrimoniais com Reis, Santana e
Correia, e sobretudo com os Dantas, reforçam essa posição de sustentação.
Assim, longe de serem periféricos, os Oliveira representavam uma linhagem de
apoio estratégico, garantindo densidade social ao poder dos Dantas e
participando ativamente da construção da hegemonia local.
Em
síntese, a trajetória dos Oliveira em Cícero Dantas revela uma linha de
continuidade histórica: no século XIX, a terra como base da família; no final
do século XIX e início do XX, os casamentos como forma de ampliar alianças; e no
século XX, os conflitos criminais e políticos, que exprimem sua inserção nas
disputas de poder. Trata-se, portanto, de uma família que soube se manter como
parte integrante da elite regional, transitando entre a posse fundiária, a
legitimação matrimonial e a participação nos embates sociais, sempre em
intersecção com os grandes troncos familiares que moldaram a sociedade
sertaneja.
Moisés Reis é
professor há 24 anos no município de Fátima (BA) e Membro da ABLAC (Academia
Brasileira de Letras e Arte do Cangaço). Licenciado em História pela UNIAGES,
com especialização em História e Cultura Afro-Brasileira pela UNIASSELVI, é
mestre em Ensino de História pela Universidade Federal de Sergipe (UFS). Autor
de diversas obras, entre elas Manual
Didático do Professor de História, O Nazista, Fátima:
Traços da sua História, O
Embaixador da Paz, Maria
Preta: Escravismo no Sertão Baiano e Últimos Cangaceiros: Justiça, Prisão e Liberdade.
Também produziu a HQ Histórias
do Cangaço e o documentário Identidade
Fatimense. Sua pesquisa concentra-se na história do sertão baiano,
com ênfase na sociedade do couro, nos processos de ocupação, nas relações de
poder e nas memórias coletivas da região.
Contato: 75 999742891
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