A família Souza/Sousa em Fátima e região.

 



Para iniciar a trajetória dessa linhagem familiar nessa área do sertão, tomarei como ponto de partida o nome de Ângelo José de Souza, mais conhecido como Ângelo Lagoa, está intimamente ligado ao processo de formação da cidade de Fátima, no sertão baiano. Casado com Porfíria Maria de Jesus, da tradicional família Canoas da Surjoa, Ângelo fixou residência na Fazenda Boa Vista, em meados da década de 1880, tornando-se o patriarca da primeira família a se estabelecer no núcleo urbano que, décadas depois, daria origem ao município.

De acordo com o inventário de Porfíria, falecida em 17 de junho de 1942, o casal deixou 15 filhos vivos e netos, muitos dos quais já nascidos na Praça Ângelo Lagoa, ainda no século XIX. Isso demonstra que a fixação do clã Souza em Fátima foi anterior à década de 1920, contrariando a versão mais difundida de que o povoamento só teria ocorrido naquela época. Nomes como Josefa Maria de Jesus, Antônio Virgílio de Sousa, Maria de Sousa Pires, Emília de Souza Reis, Francisco Virgílio de Sousa, João de Souza Sobrinho, José Virgílio de Souza, Daltro Virgílio de Souza, Sabrina Enedina de Souza e outros compõem essa descendência, que se espalharia pelos arredores de Fátima.

Ângelo Lagoa era descrito como homem branco, de olhos claros, com traços europeus, o que leva alguns de seus descendentes a especular uma possível origem holandesa — hipótese ainda em aberto, mas que ilustra o interesse em compreender as raízes dessa família. Sua mãe, de nome Genoveva, também é lembrada pela tradição oral, sem, contudo, informações detalhadas sobre seu ramo.

O casal Souza–Canoas se destacou não apenas pelo pioneirismo, mas também pelo papel organizador na comunidade. Foi Ângelo quem, na década de 1920, solicitou apoio ao coronel Chiquinho Vieira (1872–1949), chefe político de Cícero Dantas, para construir um barracão de feira na praça central, iniciativa que originou a famosa “Feirinha do Mocó”. Essa feira, criada em tempos de seca, estradas precárias e insegurança provocada por cangaceiros, tornou-se o embrião da vida econômica e social da futura cidade de Fátima.

A genealogia de Ângelo e Porfíria conecta-se diretamente a outras famílias sertanejas, sobretudo os Reis, por meio de sua filha Emília de Souza Reis, casada com Manoel Reis do Nascimento. Esse enlace evidencia a rede de alianças interclânicas que estruturava a vida política, fundiária e social do sertão baiano-sergipano. A partir dessas uniões, os Souza se ramificaram em linhagens compostas como Souza Reis, Souza Andrade, Souza Pires, Souza Trindade, Souza Campos, ampliando sua presença e influência.

A presença Souza, porém, não se restringe ao núcleo urbano de Fátima. Documentos de inventário e registros de terras revelam que outros ramos ocupavam as áreas de Maria Preta, Pedrinhas, Boa Vista, São Domingos e Serra do Mocó desde a segunda metade do século XIX. O caso de Severo Correia de Souza, proprietário da fazenda Maria Preta, é emblemático: amigo e correspondente do Barão de Jeremoabo, Severo atuava como tenente da Guarda Nacional e mantinha negócios e intrigas locais, revelados em cartas de 1898. Seu pai, Francisco Correia de Souza, deixou vasto patrimônio e uma prole numerosa em 1884, reforçando a centralidade da linhagem Souza entre os grandes proprietários da região.

Outros nomes surgem em processos criminais do Arquivo Público da Bahia, como Mariano de Souza Porto (1922), Inocêncio Firmino de Souza (1922), Libório Mattos de Souza (1900) e Marcos Paulo de Souza Dantas (1952). Esses registros confirmam que os Souza se espalharam em diversos pontos da Bahia, muitas vezes ligados aos Dantas, reforçando a ideia de alianças matrimoniais entre clãs sertanejos.

O episódio do assassinato de João Lucindo de Souza, em 18 de dezembro de 1919, é outro documento revelador: entre acusados e testemunhas, surgem nomes como Ângelo José de Souza (Ângelo Lagoa), José Vieira de Souza (José Lagoa), José de Souza Quirino, além de vizinhos das Lajes e Boa Vista. Esse processo demonstra que, já antes de 1920, havia uma comunidade estruturada, com laços familiares e rivalidades intensas, em pleno coração da atual sede de Fátima.

Assim, a partir da figura de Ângelo Lagoa, é possível compreender a formação de um tronco genealógico Souza que se entrelaça a outros clãs importantes (Reis, Dantas, Correia, Borges), estabelecendo raízes profundas no território. Ângelo, falecido em 1955, aos 94 anos, encarna a memória do pioneiro, mas sua história está inserida em um movimento mais amplo: a transformação das fazendas e arruados sertanejos em núcleos urbanos, alimentados por casamentos, alianças políticas e disputas por terra e honra.

A linhagem Souza, portanto, não é apenas um sobrenome entre outros: é uma trama de descendência e poder que atravessa a história de Fátima e do sertão baiano-sergipano, da colonização oitocentista ao município moderno.

 

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