Cícero
Romão Batista, o Padre Cícero do Juazeiro, nasceu 1844 no Crato, no estado do
Ceará. Foi ordenado padre ainda em 1870 na capital daquele estado, Fortaleza.
Pode parecer
estranho à maioria das pessoas, mas o jovem Cícero Romão não era bem visto pela
gerência do seminário. A sua religiosidade diferenciava-se dos demais por
sustentar crenças em visões e profecias, o que não era aceito pela igreja
católica. Dizia-se que aquilo se assemelharia mais ao curandeirismo do que aos dogmas
do catolicismo.
Mesmo com
tais obstáculos, ao ser ordenado padre, logo ganhou fama de milagreiro entre a
gente simples do sertão. Um caso em particular, ocorrido no Juazeiro em 1894
fez do Padre Cícero um homem santo na visão dos fiéis. Durante uma missa, ao
entregar a hóstia a um fiel esta teria virado sangue, fato testemunhado pelos
devotos e que teria se repetido por mais de uma vez.
Esse episódio
transformou não só a vida do padre, mas também da cidade de Juazeiro do Norte
por conta do número de fiéis que passaram a frequentar a cidade. Mas a fama do
padre ainda incomodava a igreja, tanto é que naquele mesmo ano (1894) foi
punido pela Santa Sé, sendo suspenso do sacerdócio. O fato encorajou o padre a
ir ao vaticano em 1898 para protestar contra aquela situação.
Mas sua
fama só crescia. Em 1911 o distrito de Juazeiro foi elevado a município e o
padre torna-se prefeito da cidade, seria aquela apenas mais uma de suas
inúmeras conexões políticas.
Tamanha
era a popularidade do padre que em 1915, chega ao juazeiro o Sírio Benjamin Abrahão
Botto. O árabe que se tornaria célebre por filmar Lampião e seu grupo
nas caatingas desse nordeste é retratado pelo historiador Frederico
Pernambucano de Melo como um aproveitador, que fez uso da boa fé do padre para
se dar bem na vida.
Durante a celebração de
uma missa no Juazeiro, o Padre Cícero não pôde deixar de notar entre os caboclos
calcinados pelo sol do sertão aquele homem branco, de boa estatura e bem
vestido. Ao final do culto, o padre pediu a um de seus assessores que
averiguassem quem era aquela figura. Ao ser interpelado pelos ajudantes do
padre, Benjamim teria respondido: “Diga ao meu padrinho que sou da terra do
nosso senhor Jesus Cristo”.
Aquela apresentação fez
de Benjamim o secretário especial do padre, morando na casa paroquial da cidade
até a morte do religioso. Ainda de Acordo com Frederico Pernambucano de Melo, o
sírio andava sempre muito bem vestido, com terno de casimira e sapatos
importados. Tal era a sua esperteza que, com a morte do padre em 1934, teria
tirado uma mecha de cabelo do cadáver para transformar e suvenir e ganhar
dinheiro.
após o episódio da morte
do Padre Cícero, benjamim fez bom uso do prestígio que o vigário tinha junto
aos bandos de cangaceiros, sobretudo Lampião. Virgulino Ferreira da Silva era
devoto do padre Cícero e chegou a visita-lo inúmeras vezes. O cangaceiro Volta
Seca, que morou na cidade vizinha de Novo Triunfo, relatou que viu o
capitão Virgulino chorar e ser acometido por uma profunda tristeza que durou
dias ao saber da morte do Padre.
Ciente disso, Benjamim
Abraão muniu-se de uma câmera de vídeo e saiu em busca de realizar inéditas
imagens dos cangaceiros. Foi motivo de constrangimento para as volantes saberem
que um gringo teria levado poucas semanas para encontrar Lampião e seu bando no
meio do mato para filmá-los em seu “habitat natural”. O filme de Benjamim Abrão
é considerado uma joia do acervo cinematográfico do cangaço. Descontraídos os
cangaceiros, inclusive Maria Bonita e Lampião posam para as fotos e deixam-se
filmar sem preocupações, afinal, aquele homem era o assessor do já falecido
Padim Ciço.
O evento com o bando de
Lampião ocorreu em 1936 mas Benjamim não parou por aí, fez diversas fotografias
de cangaceiros e volantes, registrando com entusiasmo aquela guerra ocorrida na
caatinga. Naquele mesmo ano, em Poço Redondo, Sergipe, Benjamim encontra a
volante do Tenente Zé Rufino, no encalço do cangaceiro Mariano. O sírio pede
autorização ao tenente que se deixa fotografar. Entre aqueles homens estava o
fatimense Liberino Vicente, flagrado ao lado do afamado matador de cangaceiros,
criando assim a conexão entre o Padre Cícero do Juazeiro e Fátima.
Moisés Santos Reis Amaral,
Professor há 19 anos do Município de Fátima, Licenciado em História pela
Uniages com especialização em História e Cultura Afro-brasileira, Mestre em
Ensino de História pela Universidade Federal de Sergipe.
Nenhum comentário:
Postar um comentário