O foco desse blog é a pesquisa da história do Sertão baiano.

segunda-feira, 18 de setembro de 2023

O povoamento do nosso sertão

 

Imagem: Pinterest

Para entender como a zona sertaneja do Nordeste brasileiro foi povoado pelo homem branco (a bem da verdade de maioria mestiça) é preciso compreender que, para o colonizador, toda zona situada distante do litoral era conhecida como sertão. Assim, o cerrado e mesmo a Amazônia entrava na classificação de “O grande Sertão”.

Isso posto, é igualmente importante compreender que a sociedade colonial era baseada visceralmente no litoral e sua economia inicial era fundada no cultivo da cana-de-açúcar e na produção dos seus derivados, uma economia essencialmente fundamentada na exportação.

Ocorre que, com o aumento da população dessa zona litorânea, percebeu-se a necessidade da produção de carne para o abastecimento interno e foi daí que um problema fez com que o colonizador voltasse seus olhos para o sertão ermo, seco e povoado por povos indígenas.

As férteis terras litorâneas eram decerto muito valorizadas pelos senhores de engenho que faziam uso do seu potencial para produzir a cana em enormes lavouras cujo verde dominava a paisagem. Nessa área, iniciou-se a criação de gado, mas as constantes invasões dos rebanhos às plantações de cana e os vultosos prejuízos causados, levou a imponente elite açucareira a pressionar o governo a editar uma lei proibindo a pecuária no litoral, obrigando os interessados na criação do gado a adentrar os sertões em busca de pastagens.

Assim, inicialmente através dos rios, os vaqueiros vão ocupando o sertão, abrindo novas pastagens e criando enormes fazendas com mão-de-obra mista (escarava e de libertos). Aos poucos os chamados “caminhos do boi” foram sendo abertos pela passagem das boiadas que seguiam para o litoral após um período de engorda, uma vez que a única maneira de levar carne fresca do sertão para o litoral era levando o animal vivo.

Ao longo do caminho, pequenos povoamentos vão se formando e esses dariam origem a cidades. Na região da Bahia que hoje tem a denominação de Semiárido Nordeste II, municípios como Jeremoabo, Ribeira do Pombal e Cícero Dantas são fruto desse fluxo de bois e pessoas, do lado sergipano da fronteira, cidade como Lagarto e Simão Dias seguem o mesmo padrão. Mais que isso, em maior ou menor grau, todos os municípios do Semiárido tiveram a mesma origem.

As boiadas que seguiam do Rio São Francisco para Sergipe, tinham a Vila de Lagarto como importante entreposto, do lado baiano, Jeremoabo, Bom Conselho (Cícero Dantas) Cana Brava (Pombal) e Saco dos Morcegos (Banzaê) também tiveram essa classificação.

O destaque fica para Bom Conselho que tinha uma posição estratégica, o povoamento no qual, em 1812, o Frei Apolônio de Todi ergueu uma pequena capela, era ponto de passagem dos comboios que seguiam do São Francisco para a Bahia (como era conhecida a cidade de Salvador) e era via para as boiadas que seguiam para Sergipe, fazendo da cidade um verdadeiro entroncamento regional.

O boi tinha tanta importância para a economia nacional que, além da carne, a produção de couro chegou a ser o terceiro produto na pauta de exportação do país. Outro produto importante para essa região sertaneja foi o algodão. Bem adaptado ao clima local, o algodão foi cultivado em pequenas propriedades e seguiam para o litoral em grandes fardos, o acesso era através dos portos sergipanos. Na cidade de Salgado - Se, uma linha férrea era utilizada para esse escoamento. Essa linha férrea, inclusive, foi estudada para uma ampliação, um novo ramal que ligaria o nordeste da Bahia ao litoral sergipano entrou em pauta no século XIX, mas a ideia foi barrada pela influência de políticos baianos.

Toda a produção de algodão sertanejo tinha destino certo, a Europa. Durante a revolução industrial, as fábricas do continente faziam uso do algodão produzido no sertão, que chegava ao destino final via navio.

Se o fluxo de mercadoria era grande entre o sertão e o litoral, o inverso não era necessariamente verdadeiro. Poucos comerciantes se aventuravam pelas desérticas paisagens sertanejas para praticar o comércio, a exceção foram os tropeiros, comerciantes errantes que vendiam sua mercadoria quase que de porta em porta, abastecendo as bodegas sertanejas dos produtos do litoral, a maioria dos quais, importados da Europa e EUA.

E assim, uma sociedade dinâmica foi se formando, as relações comerciais foram sendo intensificadas, as fazendas foram se modernizando e o homem sertanejo foi sendo lapidado na lida do gado. Frederico Pernambucano de Melo defende que o indivíduo acostumado com a dureza da vida sertaneja, com as lutas contra os indígenas e diante da peleja com o gado, foi formando-se forte e destemido, com um rígido código de honra onde, por vezes, as rusgas eram resolvidas no cano do fuzil.

Foi essa sociedade, formada no isolamento em relação ao litoral que, segundo o referido autor, pôde gerar o fenômeno do cangaço. Para fundamentar sua tese, o estudioso argumenta que há uma identificação entre o sertanejo e o cangaceiro, uma admiração que dura até hoje, por aqueles homens e mulheres que protagonizaram momentos de extrema violência.

 

Moisés Santos Reis Amaral, Professor há 21 anos do Município de Fátima, Licenciado em História pela Uniages com especialização em História e Cultura Afro-brasileira, Mestre em Ensino de História pela Universidade Federal de Sergipe. Autor das obras: Manual Didático do Professor de História, O Nazista e da HQ Histórias do Cangaço e dos livros Fátima, traços da sua história e O Embaixador da Paz.

 

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