Era 28 de agosto de 1903, entardecer
na Vila de Bom Conselho, quando 40 homens armados chegam à casa do juiz da local,
o magistrado Antônio Pedreira Cerqueira, conhecido como Dr. Pedreira. Aqueles homens
estavam sob as ordens do então comissário de polícia, Pedro Correia de Sousa e
traziam um cavalo arreado.
Entraram na casa do juiz alheios aos gritos dos filhos e da
esposa e arrancaram a autoridade de dentro da residência fazendo-o montar no
animal sobressalente sob as ordens do comissário que afirmava não ser mais
possível ao magistrado atuar no Bom Conselho. Conduziram-no por longo caminho
até o engenho Camurciatá, propriedade do barão de Jeremoabo, no município de
Itapicuru. Dois dias depois, a família do juiz deixou a vila para encontra-lo.
Toda essa ação foi capitaneada pelos Correias e Vieiras,
duas famílias que se unem em laços históricos antigos em Cícero Dantas. Mas o
que teria motivado tamanha violência? O que poderia ter levado à expulsão forçosa
do juiz da cidade pelos mandatários locais?
De acordo com o historiador Marcelo Reis, o juiz Pedreira,
havia libertado um homem, preso injustamente. Ocorre que esse indivíduo era um
desafeto antigo de Manoel Vieira de Andrade, o Mané Vieira.
Para fins didáticos e para situar esse indivíduo na atual
família Vieira de Cícero Dantas, Mané Vieira era pai de Chiquinho Vieira, que,
por sua vez, é o avô do ex-prefeito de Cícero Dantas, Hélio Vieira, ainda vivo
nos dias de hoje.
A soltura do desafeto, teria levado a uma reação em cadeia
que, de acordo com depoimentos colhidos por Marcelo Reis, levaria ao trágico
suicídio de Mané Vieira.
A ação realizada em Bom Conselho repercutiu na imprensa
baiana. Na edição de 14 de agosto de 1903, o jornal da capital CORREIO DO
BRASIL, noticiava com grande alarde os fatos.
De oposição ao governador Severino Vieira, o periódico
tratou de culpar o governo do estado pelo ato violente e de citar motivações
eleitoreiras. Fazendo a defesa incisiva do magistrado deposto, o texto cobra a
exoneração do comissário de polícia e afirma: “O Dr. Pedreira tinha o pecado de
não ser um magistrado político”.
Na edição de 16 de setembro, o mesmo veículo de informação
afirma que no interior da Bahia, essas arbitrariedades não eram novidades, cita
o caso do juiz de Monte Santos que, meses antes, tinha se mudado às pressas da
comarca por medo da violência.
O próprio Antônio Pedreira publicaria artigo no mesmo
jornal afirmando que, no calor do momento, ele mesmo teria solicitado aos seus
algozes que o levassem para a propriedade do Barão em Itapicuru e que não
voltaria ao Bom Conselho pois isto seria, em suas palavras: “Morte certa”.
Mesmo após a repercussão negativa do fato, o comissário de
polícia Pedro Correia, que era membro da poderosa família e tio do promotor
local, foi mantido no cargo pelo governador. Sabendo disso, o jornal acusa Severino
Vieira de ter, ele mesmo, planejado a ação em conluio com seus correligionários
locais.
O sertão sempre foi palco de atos violentos, com a ausência
do estado nos primórdios da colonização, as pessoas aprenderam a fazer justiça
com as próprias mãos, a arma sempre ao alcance, foi um recurso recorrente para a
vingança ou para a coerção.
Os homens que arquitetaram a expulsão do juiz, acreditavam
ter o direito de impor pela via da força os seus interesses. Nos dias atuais,
coagir um juiz a deixar a comarca é um ato quase impensado, mas para os nossos
ancestrais, fazia parte do jogo de interesses.
Moisés Reis, Professor há 24
anos do município de Fátima, Licenciado em História pela Uniages com
especialização em História e Cultura Afro-brasileira pela UNIASSELVI, Mestre em
Ensino de História pela Universidade Federal de Sergipe. Autor das obras: Manual
Didático do Professor de História - O Nazista - Fátima: Traços da
sua Histórias - O Embaixador da Paz - Maria Preta: Escravismo no
sertão baiano – Últimos Cangaceiros, Justiça, prisão e liberdade - da HQ
Histórias do Cangaço e do documentário Identidade Fatimense.
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