O foco desse blog é a pesquisa da história do Sertão baiano.

sexta-feira, 27 de setembro de 2024

Anticomunismo interiorano


 


Comunista é o pseudônimo que os conservadores e saudosistas do fascismo inventaram para designar todo sujeito que luta por justiça social.

Érico Verissimo.

 

 

Linha do tempo

 

1848- Lançamento de O Manifesto do Partido Comunista;

1917 - Revolução Russa;

1930 – Revolução que marca o fim da primeira república;

1935 – Levante comunista;

1937 – Plano Cohen;

1964- Golpe Militar;

 

 

1.     CONTEXTO HISTÓRICO GERAL.

 

          De uma forma ou de outro, o anticomunismo brasileiro vai ter início após a publicação do Manifesto do Partido Comunista em 1848. Já naquela época, falava-se de uma estranha ideologia política com ideias exóticas, muito distante da realidade de um país como o Brasil, uma país que ainda vivia sob a sombra maldita da escravidão.

          Nesse período, com efeito, o distanciamento e o exotismo dos ideais comunistas eram os parâmetros para a elite letrada brasileira, uma vez que as ideias de Marx e Engels soavam como algo quase alienígena, mas que, em certa medida, já incomodava os mandatários locais, na medida em que os faziam sentir ameaçados os seus privilégios. Aqui vale lembrar que a elite agroindustrial brasileira era composta por linhagens seculares, com privilégios consolidados.

          Mas a distância ainda era a regra, até que, em 1917 irrompe a revolução russa e pautas como reforma agrária, direitos dos trabalhadores e outros entram no imaginário popular brasileiro.

          Para uma sociedade acostumada ao sistema escravista, temas como esses eram que tabus intransponíveis. Basta lembrar a frase de Washington Luiz, presidente da república de 1926 a 1930:

 

“A questão social é um caso de polícia”.

 

          Essa fala, proferida pelo então presidente, reflete como se encaravam todas as questões sociais no Brasil, um país que ainda carecia de um código de leis trabalhistas e que encarava o trabalhador como algo meramente descartável. O fantasma dos direitos sociais significava na cabeça da elite local uma mão-de-obra mais cara, trabalhadores ascendendo socialmente e ocupando os seus espaços de privilégio.

          Chegou-se a afirmar que essa ideologia não vingaria no Brasil, pois seu operariado seria, de acordo com a concepção burguesa, “ordeiro e pacífico”. Hostilizava-se o estrangeiro por incutir essas ideias no país e o medo imperava.

          Com a crise de 1929, o capitalismo é posto em xeque, cada vez mais o liberalismo parecia utópico, a crise arrasou a economia global, desemprego, fome, miséria e outras mazelas passaram a fazer parte do cotidiano das pessoas. Na Europa, passou-se a desejar governos mais fortes e com viés nacionalista, era o que os fascistas esperavam para subir ao poder.

 

2.     SERTÃO NÃO É LITORAL.

 

Na obra GUERREIROS DO SOL, Frederico Pernambucano de Melo defende que no sertão, apartado do litoral, se formou uma sociedade totalmente distinta. Distanciados pela geografia e a dificuldade de locomoção, sertanejos e habitantes da atual Zona da Mata divergiam em quase tudo no quesito comportamento.

          Enquanto os que beiravam o oceano atlântico lutavam para manter um estilo de vida europeu com hábitos refinados e vestimenta baseada no além-mar, o sertanejo precisava se adaptar à dureza do meio, vestindo-se como as condições econômicas permitiam e trajando pesadas roupas de couro, verdadeiras armaduras contra a espinhosa caatinga na qual se embrenhavam atrás do gado.

          Ainda de acordo com o mesmo estudioso, dois meios de vida e, por consequência, dois indivíduos, se desenvolveram no sertão, ambos resistentes e duros. Enquanto os agricultores resistiam fisicamente ao sol e aos desafios da seca, o vaqueiro se forma como um indivíduo ainda mais rude. Para este, a lida com o gado imprimia em si um sentimento de nomadismo, uma vez que a parca estrutura das propriedades o obrigava a mudar-se constantemente em busca de novas áreas de pastagens.

          A lida com o gado e os embates com os indígenas o fez resistente e destemido, o ambiente o fez desconfiado, a pobreza gerava violência e em um ambiente onde rusgas se resolviam na ponta da faca ou na boca do Cravinote (Bacamarte, em outras regiões), a confiança era um luxo e o apego pela arma era fundamental.

          A ausência dos mecanismos de coerção estatal como a justiça e as polícias, criou nesse povo um sentimento de injustiça e a lei era feita sob a égide das suas próprias mãos, detinham um acurado sentimento de autodefesa e um código de ética primitivo aos olhos de quem não conhecia. Cultivaram um tipo de catolicismo místico, extremamente fanatizado.

          Para SANTOS, 2024, esse ambiente deu origem ao sentimento de que matar não é crime, não somente pela noção da lei do mais forte, mas pela necessidade de autodefesa, física e, por vezes, da sua própria honra ou dos seus.

 

3.     COMO O ANTICOMUNISMO FOI PROPAGADO NO SERTÃO?

 

As ideias anticomunistas vão acessar o sertão a partir de dois caminhos ao mesmo tempo distintos e correlatos. O primeiro e mais convincente, vem a ser a igreja católica e o discurso persuasivo dos padres.

O segundo, que não perdia a oportunidade de citar as encíclicas e os sermões dos vigários, era a imprensa interiorana, representada pelos jornais locais de circulação intermunicipal. Nesse capítulo, analisaremos a ambos, iniciando pela importante e eficiente ação encabeçada pela igreja católica e seus sacerdotes.

 

Cenas dos próximos capítulos ...


Moisés Reis, Professor há 22 anos do Município de Fátima, Licenciado em História pela Uniages com especialização em História e Cultura Afro-brasileira pela UNIASSELVI, Mestre em Ensino de História pela Universidade Federal de Sergipe. Autor das obras: Manual Didático do Professor de História, O Nazista, Fátima: Traços da sua Histórias, O Embaixador da Paz, Maria Preta: Escravismo no sertão baiano, e da HQ Histórias do Cangaço e do documentário Identidade Fatimense.



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