O foco desse blog é a pesquisa da história do Sertão baiano.

quarta-feira, 23 de julho de 2025

NAÇÃO e SÍTIO, águas que testemunharam o princípio de Fátima.

 


NAÇÃO e SÍTIO, águas que testemunharam o princípio de Fátima.

 

Após a carta régia de 1701 que direcionou a criação de gado para o sertão, as primeiras estradas (caminhos do boi) começaram a ser abertas, eram veredas que serviam para o transporte do gado que engordava no sertão e era conduzido para o abastecimento dos mercados de carne no litoral. 

Como não havia tecnologia para refrigeração, as únicas formas de fazer com que a carne chegasse aos locais de consumo no litoral era a produção da carne seca ou a condução dos animais vivos até os locais de abate, sendo essa segunda técnica utilizada em larga escala.

Quem conhece o sertão, sabe que nessa zona existem apenas duas estações, uma seca e outra chuvosa. Essa peculiaridade climática, obrigava o sertanejo a construir estruturas rudimentares para preservar a preciosa água que fluía nas enxurradas durante o período chuvoso.

Inicialmente eram estrutura simples, construídas informal e coletivamente. Próximos a córregos temporários ou mesmo a olhos d’água naturais, construíam pequenas barragens de pedras, valas cavadas de forma rústicas, estruturas que pudessem reter a água no período mais seco do ano.

Essas pequenas barragens eram construídas em locais estratégicos, posicionadas a algumas léguas de distância uma da outra ao longo do caminho. Inicialmente, como dito, eram estruturas de uso comum, mas sem intervenção estatal. Isso mudou a partir da grande seca de 1877 a 1879, esse período de estiagem foi um marco histórico, suas consequências avassaladoras levaram o Estado Imperial a buscar intervir com planejamento de segurança hídrica.

É após essa grande seca que as antigas barragens já projetadas pela mente intrépida do sertanejo recebem investimento público e melhorias para que pudessem armazenar ainda mais água e garantir o precioso líquido às grandes boiadas e ao ser humano. Por serem construídas pelo Estado, ficaram conhecidos como TANQUES DA NAÇÃO.

Esses locais eram utilizados como pontos de paragem para boiadeiros e demais viajantes e no seu entorno foi-se formando lugarejos com pequena população habitando casas simples, cobertas de palha que, ao longo dos anos, vão se multiplicando e sendo aperfeiçoadas.

        Em Fátima, ainda existe até os dias de hoje um exemplar raro de uma obra pública muito antiga, a “Nação” e o “Sítio” são obras remanescentes desse período. Inicialmente deve ter sido uma estrutura simples, provavelmente construída por mão-de-obra escravizada, que foi sendo ampliada aproveitando o antigo córrego que outrora corria por onde hoje é a zona urbana do município.

          Não se sabe a data exata, mas é certo que essa aguada recebeu investimentos em melhorias, foi ampliada e por muitos anos matou a sede de seres humanos e animais, abasteceu as obras de muitas das antigas casas aqui construídas e foi palco do trabalho árduo de sofridas senhoras que ali se juntavam para lavar suas roupas até os anos 1980.

          Antes da perfuração do poço e da construção da Bomba em 1954, essas duas represas eram a principal fonte de abastecimento de água de Fátima, ficando às margens da Estrada Real, virou ponto de parada dos antigos viajantes, boiadeiros e tropeiros acampavam em suas margens, faziam suas refeições e eventualmente passavam a noite para seguir viagem no dia seguinte. Com o tempo, muitos utilizavam a casa do senhor Chico André como pensão, esses últimos, testemunhas da evolução do antigo povoado que viria a ser a Fátima que habitamos.

         

 

Após a carta régia de 1701 que direcionou a criação de gado para o sertão, as primeiras estradas (caminhos do boi) começaram a ser abertas, eram veredas que serviam para o transporte do gado que engordava no sertão e era conduzido para o abastecimento dos mercados de carne no litoral. 

Como não havia tecnologia para refrigeração, as únicas formas de fazer com que a carne chegasse aos locais de consumo no litoral era a produção da carne seca ou a condução dos animais vivos até os locais de abate, sendo essa segunda técnica utilizada em larga escala.

Quem conhece o sertão, sabe que nessa zona existem apenas duas estações, uma seca e outra chuvosa. Essa peculiaridade climática, obrigava o sertanejo a construir estruturas rudimentares para preservar a preciosa água que fluía nas enxurradas durante o período chuvoso.

Inicialmente eram estrutura simples, construídas informal e coletivamente. Próximos a córregos temporários ou mesmo a olhos d’água naturais, construíam pequenas barragens de pedras, valas cavadas de forma rústicas, estruturas que pudessem reter a água no período mais seco do ano.

Essas pequenas barragens eram construídas em locais estratégicos, posicionadas a algumas léguas de distância uma da outra ao longo do caminho. Inicialmente, como dito, eram estruturas de uso comum, mas sem intervenção estatal. Isso mudou a partir da grande seca de 1877 a 1879, esse período de estiagem foi um marco histórico, suas consequências avassaladoras levaram o Estado Imperial a buscar intervir com planejamento de segurança hídrica.

É após essa grande seca que as antigas barragens já projetadas pela mente intrépida do sertanejo recebem investimento público e melhorias para que pudessem armazenar ainda mais água e garantir o precioso líquido às grandes boiadas e ao ser humano. Por serem construídas pelo Estado, ficaram conhecidos como TANQUES DA NAÇÃO.

Esses locais eram utilizados como pontos de paragem para boiadeiros e demais viajantes e no seu entorno foi-se formando lugarejos com pequena população habitando casas simples, cobertas de palha que, ao longo dos anos, vão se multiplicando e sendo aperfeiçoadas.

        Em Fátima, ainda existe até os dias de hoje um exemplar raro de uma obra pública muito antiga, a “Nação” e o “Sítio” são obras remanescentes desse período. Inicialmente deve ter sido uma estrutura simples, provavelmente construída por mão-de-obra escravizada, que foi sendo ampliada aproveitando o antigo córrego que outrora corria por onde hoje é a zona urbana do município.

          Não se sabe a data exata, mas é certo que essa aguada recebeu investimentos em melhorias, foi ampliada e por muitos anos matou a sede de seres humanos e animais, abasteceu as obras de muitas das antigas casas aqui construídas e foi palco do trabalho árduo de sofridas senhoras que ali se juntavam para lavar suas roupas até os anos 1980.

          Antes da perfuração do poço e da construção da Bomba em 1954, essas duas represas eram a principal fonte de abastecimento de água de Fátima, ficando às margens da Estrada Real, virou ponto de parada dos antigos viajantes, boiadeiros e tropeiros acampavam em suas margens, faziam suas refeições e eventualmente passavam a noite para seguir viagem no dia seguinte. Com o tempo, muitos utilizavam a casa do senhor Né André como pensão, esses últimos, testemunhas da evolução do antigo povoado que viria a ser a Fátima que habitamos.

         

 


terça-feira, 22 de julho de 2025

ASSOMBRAÇÃO DA MARIA PRETA

 

A área onde existia a antiga fazenda Maria Preta carrega há muito tempo uma aura pesada, uma sensação de que algo de muito ruim aconteceu ali. Desde tempos imemoriais que as pessoas relatam visões inexplicáveis, sensações estranhas ao passar por determinados trechos da estrada que liga a região do João Barbosa e a zona urbana do município, sobretudo nas imediações do Pisa-macio.

          Entre sensações estranhas e visões inexplicáveis, existem relatos de avistamentos de pessoas ou animais que desaparecem misteriosamente, causando pavor em algumas pessoas. Quando eu era criança, sempre evitava andar por aquela região de tanto ouvir falar de assombrações.

          Assombrações, “malassombros”, “paracé”, alma pena. Muitas são as denominações, muitas são as formas que o sertanejo tem de se referia ao inexplicável.

          O meu blog fala de história e tomando a história como uma ciência, é necessário cautela ao tratar de certos assuntos. Não existem evidências científicas da vida após a morte ou mesmo de pessoas que voltam de outro plano para nos assombrar.

          Dito isso, é necessário que se compreenda (além das questões de fé), que o simples fato de existir nessa região específica uma “atmosfera ruim”, me desperta o interesse de conhecer as razões para esse fenômeno.

          Conhecendo o passado daquele torrão, algumas questões me parecem importantes para se pensar acerca do caso. A principal problemática que me surge é o fato de ali ter sido um local de sofrimento para as pobres criaturas expostas às agruras da escravidão. Os escravizados de Severo Correia sofreram, naquele mesmo espaço territorial, as chibatadas embaixo do Pé de Caixão, o desrespeito dos sepultamentos sem qualquer liturgia e uma gama de situações absolutamente cruéis.

          O que é comum ouvir de algumas pessoas que conhecem a história e que habitam aquela região há muitos anos, é a associação entre as ditas assombrações e as mazelas dos escravos da Maria Preta, como se tal processo histórico tivesse criado uma zona amaldiçoada ou algo nesse sentido.

          Pessoalmente, concordo e discordo desse linha argumentativa, compreendo que as angústias dos antigos escravizados produziram a má fama do lugar, mas não entendo que isso tenha causado algo sobrenatural, o meu palpite é que as histórias de sofrimento e injustiça, associado ao cemitério de escravos perdido no tempo, tenham atravessado as gerações, produzindo nas pessoas a sensação de que algo de ruim tenha acontecido ali, o resto fica por conta da imaginação e das crendices do sertanejo. 

segunda-feira, 21 de julho de 2025

Mais um filho de Ângelo Lagoa e Porfíria:

 

Francisco Virgílio de Souza nasceu em 1896, na atual Praça Ângelo Lagoa, era o 6° filho do casal fundador. Casou com Maria Francisca de Souza no dia 28 de novembro de 1923, quando Fátima ainda se chamava Mocó. O casal teve nove filhos que deixaram um grande número de descendentes. 

segunda-feira, 14 de julho de 2025

Sertão violento, assassinato em Bom Conselho, 1874.

 


Um grupo de 4 homens, entre eles dois peritos amadores, deixa Bom Conselho (atual cidade de Cícero Dantas) após o almoço em direção à fazenda Cajazeiras, tinham a ingrata missão de periciar o corpo de uma menina de doze anos, brutamente assassinada a pauladas.

Era 19 de abril de 1874, e a cena encontrada na casa de João Sacerdote do Nascimento foi terrível. No alpendre da simples casa de taipa, o corpo franzino de uma menina branca estava estendido, tinha a cabeça esfacelada por golpes de um porrete de tal modo que os peritos Manoel Joaquim da Silva e Joaquim Dantas de Miranda não tiveram condições de precisar quantos golpes foram o suficiente para produzir tamanho estrago.

Além dos peritos, estiveram na ocasião do exame de Corpo de Delito o subdelegado e o escrivão, responsável por produzir as primeiras linhas dessa história ocorrida há mais de 150 anos.

O assassino, José D’Assunção, era primo da vítima. Censão, como era conhecido, era tido como um toleirão, era um homem bem mais velho que aparentemente se apaixonou pela prima de 12 anos. Na época, era comum que uma menina se casasse tão jovem, entretanto, para a ira de Censão, a opinião da pretendente era levada em consideração.

Ana morava somente com a mãe e o irmão Antônio, pois seu pai, na época, já havia falecido, conforme consta no processo crime identificado como 03/85/42, de posse do Arquivo Público do Estado da Bahia. Sua frieza frente as investidas do pretendente o levaram a elaborar um plano para o assassinato, mostrando que ações violentas de homens rejeitados infelizmente não são exclusividades do nosso tempo.

Os registros nos permitem concluir que Censão havia planejado o fato, era um homem imaturo para o seu tempo, o que lhe rendeu o adjetivo “toleirão”, mas era dotado de um temperamento perverso e calculista. Durante as agressões à menina Ana, não deu qualquer chance de defesa à vítima, fulminando-a com brutalidade.

Os irmãos haviam passado aquela noite na casa do seu tio José Martins e pela manhã seguiam calmamente pela estrada em direção à casa da mãe, sendo abordados durante esse trajeto.

Entre os depoimentos que constam no processo, a descrição do menino Antônio é de longe o mais detalhado e impactante. Perguntado, respondeu ter entre 8 a 9 anos, ser filho de Pedro Borges Souza de Andrade e Maria do Espírito Santo. Disse que, vindo da casa do seu tio José Martins para a casa de sua mãe, com sua irmã Ana, foi surpreendido pelo assassino que saiu do mato, era seu primo, Francisco da Assunção, conhecido por todos como Censão.

Este, teria perguntado a Ana a razão da sua frieza e se ela desejava se casar com ele. Diante da recusa da moça, Censão, tomado de ódio, avançou sobre Ana e desferiu algumas pancadas em sua cabeça. Ainda tomando como base o depoimento do menino Antônio, Ana caiu em decorrência das pancas e pediu socorro a ele. Foi nesse momento que o menino avançou sobre Censão, homem feito, com idade estimada entre 36 e 37 anos.

Antônio segurou firmemente a arma do agressor, diante da insistência do menino em não soltar o porrete, a fúria de Censão se volta agora para ele que é violentamente atingido na cabeça e cai a sangrar.

Ao se desvencilhar do garoto, o assassino se volta para Ana, agarra-a pelos cabelos e arrasta para o mato onde conclui o crime. Diante da impossibilidade de defender ele mesmo sua irmã, Antônio corre até a casa do seu tio para pedir ajuda.

É através de outra testemunha que sabemos do que ocorre em seguida. Francisco estevão, então com 60 anos de idade, natural do Bom Conselho afirma que, estando na casa de João Sacerdote, afirmou que José Martins chegou ao local informando que o menino Antônio esteva em sua casa, lavado em sangue, e dizia que Censão tinha matado a sua irmã.

Todos seguem até a casa de José Martins e, junto com Antônio, decidem ir até o lugar do crime. Ao chegar ao trecho indicado da estrada, perceberam logo o local por onde Ana tinha sido arrastada e depois de muito procurarem, encontraram o cadáver em cima de uma moita de capim, os ferimentos na cabeça da menina faziam sair a massa encefálica, mas ela ainda respirava. Tomada nos braços, Ana foi levada agonizando para a casa de João sacerdote, onde morre não muito tempo depois.

Cenção foi jugado e preso pelo seu crime e cumpriu pena em Jeremoabo, não se sabe as circunstâncias da sua morte, mas é possível inferir que morreu enquanto cumpria pena, provavelmente de alguma enfermidade. A perícia em seu corpo é datada de 19 de junho de 1875, cerca de um ano após a morte de Ana.

A cajazeira, palco do terrível acontecimento, pertence ao município de Cícero Dantas, fica nas imediações do povoado Trindade e, de acordo com o pesquisador Marcelo Reis, não é mais habitada, uma vez que seus antigos moradores hoje vivem nas cidades vizinhas. Ainda de acordo com Marcelo, seu avô lembra da antiga cruz que marcava o local da morte, mas hoje toda a área foi transformada em pasto e a localização da cruz não é mais conhecida.


Moisés Reis, Professor há 24 anos do município de Fátima, Licenciado em História pela Uniages com especialização em História e Cultura Afro-brasileira pela UNIASSELVI, Mestre em Ensino de História pela Universidade Federal de Sergipe. Autor das obras: Manual Didático do Professor de História - O Nazista - Fátima: Traços da sua Histórias - O Embaixador da Paz - Maria Preta: Escravismo no sertão baiano – Últimos Cangaceiros, Justiça, prisão e liberdade - da HQ Histórias do Cangaço e do documentário Identidade Fatimense.


Contato

Fone

75 – 99742891

E- mail.

moisessantosra@gmail.com


 

segunda-feira, 7 de julho de 2025

Você sabe o significado das pedras nas capelinhas e túmulos?


 

Em diversos locais do sertão, não é difícil visualizar pedras cuidadosamente colocadas em cima de túmulos ou mesmo nas capelinhas que marcam o local da morte de alguém. Não é difícil imaginar que a maioria das pessoas que praticam esse antigo costume não faz ideia da razão para essa prática.

O que poucos sabem é que é esse um costume judeu, trazido ao Brasil há séculos pelos chamados Cristãos-novos, judeus convertidos forçosamente ao catolicismo.

No judaísmo tradicional, o ato de colocar pedras sobre túmulos ao visitar um cemitério é uma prática de origem muito antiga, provavelmente ligada às vivências de povos do deserto. Além de indicar respeito pelos mortos e marcar a presença de quem visita, as pedras ajudavam a manter o túmulo visível e protegido contra animais ou erosões em solos arenosos. Essa simbologia atravessou gerações e migrou junto com os judeus para diferentes partes do mundo.

No Nordeste brasileiro, sobretudo no Sertão, chegaram cristãos-novos (judeus convertidos à força ao cristianismo durante a Inquisição) que carregavam traços de práticas e memórias judaicas – muitas vezes diluídas ou sincretizadas. Em regiões áridas como o Sertão, o ambiente de caatinga com sua paisagem pedregosa poderia ter facilitado a preservação, mesmo que inconsciente, desse gesto cultural. Assim, a presença de pedras em túmulos no semiárido pode dialogar com uma tradição ancestral de marcar a memória e a visita aos mortos, incorporada ao contexto sertanejo sem necessariamente ser reconhecida como uma herança judaica direta.

A pedra tem ainda uma simbologia importante, diferente as flores que se esvaem com alguns dias, as pedras são permanentes, representando a durabilidade da memória dos que se foram.