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quarta-feira, 5 de abril de 2023

Fátima, século XIX.

Hoje já se sabe que a área onde hoje se localiza Fátima e povoações vizinhas já é habitada desde o século XIX, nesse sentido, o primeiro ponto a considerar é que o município ocupa uma área relativamente extensa, marcada por diferentes dinâmicas de ocupação ao longo do tempo. Para situar a discussão, restringir-nos-emos, neste texto, aos primeiros núcleos de povoamento nas regiões que compreendem a atual sede municipal e suas adjacências.

A sede do município apresenta particularidades históricas próprias. Desde 1825, já havia registros cartográficos e documentais de fazendas na região, conforme inventários dos bens pertencentes à Casa da Torre. Entre eles, destacam-se as fazendas Mocó e Lagoa da Volta (1829) e Barriguda (1833). Ainda assim, há indícios de que a ocupação efetiva dessas terras tenha ocorrido apenas a partir da segunda metade do século XIX.

Um exemplo é a fazenda Maria Preta, cujas terras, pertencentes a Severo Correia, já estavam voltadas para atividades agropecuárias nesse período, conforme documentação disponível. Outras propriedades, algumas ainda hoje conhecidas pelos mesmos nomes, também se encontravam em funcionamento entre 1850 e 1899, período que será nosso foco a seguir.

Na localidade da Laje da Boa Vista, situada nas proximidades da atual zona urbana, nasceram, segundo registros do Arquivo Público, Francisco Félix de Oliveira (Chico Félix) em 1885, Pedro Félix de Oliveira em 1892 – ancestrais de João Maria de Oliveira e de várias famílias fatimenses contemporâneas – e Theodora Maria das Virgens, em 1891, todos na mesma região. Documentos também apontam o nascimento de José Veríssimo do Nascimento, em 1859, na Cutia, próximo às Pedrinhas; Manoel Geraldo, nascido por volta de 1890 nas Pedrinhas; e José de Souza Quirino, oriundo do Mundo Novo, nas proximidades do atual povoado Quirinos, também cerca de 1890. Um outro indivíduo, homônimo, aparece como comprador da fazenda Mundo Novo em 1857, talvez o pai desse primeiro.

Essas informações nos permitem concluir que, entre 1850 e 1899, a área correspondente à atual sede municipal de Fátima era composta por diversas fazendas, cujos habitantes mantinham relações sociais e econômicas entre si. Muitos desses moradores do século XIX tornaram-se os ancestrais de boa parte das famílias fatimenses de hoje.

No início do século XX, o processo de povoamento intensificou-se ainda mais. O assassinato de João Lucindo, já abordado em outro texto deste Blog, fornece pistas relevantes sobre a organização social da época. O crime, ocorrido em 1919, teria sido motivado por vingança e envolveu diferentes linhagens familiares da região, revelando laços de convivência complexos, característicos de comunidades estabelecidas há anos.

Em outras palavras, o episódio demonstra que aquelas famílias mantinham relações de cooperação suficientemente sólidas para planejar ações conjuntas, o que pressupõe uma convivência prolongada. Além disso, o fato de a rota utilizada por João Lucindo entre a Ilha e Simão Dias ser bem conhecida de seus algozes indica que a antiga localidade do Mocó era um ponto de passagem frequente para viajantes e comerciantes.

Outro elemento relevante é a menção, no processo criminal de 1919, ao nome de Ângelo Lagoa, apontado como “morador da Serra do Mocó”. Esse registro antecipa a data tradicionalmente associada à sua chegada à região (década de 1920), sugerindo que ele já possuía relações sociais consolidadas antes desse período. Um dos envolvidos no caso, Manoel Reis do Nascimento, era seu genro, evidenciando que Ângelo Lagoa já havia constituído família localmente anos antes do episódio.





 

Moisés Reis, Professor há 24 anos do município de Fátima, Licenciado em História pela Uniages com especialização em História e Cultura Afro-brasileira pela UNIASSELVI, Mestre em Ensino de História pela Universidade Federal de Sergipe. Autor das obras: Manual Didático do Professor de História - O Nazista - Fátima: Traços da sua Histórias - O Embaixador da Paz - Maria Preta: Escravismo no sertão baiano – Últimos Cangaceiros, Justiça, prisão e liberdade - da HQ Histórias do Cangaço e do documentário Identidade Fatimense.

 

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